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UMA IDEIA FIXA E MUITAS CÂMERAS EM MÃOS

Aquela que promete ser a mais longa “novela” da televisão brasileira começa a render boas discussões. Um primeiro acordo foi fechado pela Simba Content – que representa SBT, Rede TV! e Record TV. A outra parte na negociação é a operadora Vivo TV de canais por assinatura.

O tom da conversa começa a ficar mais amigável, mas ainda não perdeu as características de briga. Se não é briga, por que as partes divulgaram a realização de um “acordo” ao invés de um contrato? Empresas não são constituídas para gerar litígios e sim para oferecerem produtos que vão ser contratados pelo mercado. Mais ainda no caso em questão, que envolve dois segmentos complementares de um mesmo mercado.

A culpa pode ser de algum vício de regulamentação, como acontece com tudo que tem muitas regras “oficiais”. No Brasil emissoras de TV e operadoras de serviço por assinatura são tradicionais desafetas, porque sempre conviveram de maneira forçada. A Anatel, que é a agência reguladora do setor, adotou o modelo must carry, segundo o qual as operadoras não podem escolher entre uma ou outra emissora aberta. Ou exibem todas ou não exibem nenhuma. Como a TV Globo reina absoluta na audiência, nenhuma operadora pensa em ficar sem o “plim plim”. Automaticamente, todas as outras passam a ter lugar na programação. Com a chegada do sinal digital mudou tudo. Quando o sinal analógico é desligado numa região, passa a vigorar o novo regulamento, que elimina a obrigatoriedade.

No final do ano passado a Simba foi formada com o objetivo anunciado de dar mais força às três emissoras para negociar com as operadoras. O preço “de tabela” seria de R$ 15,00 por assinante que recebesse as programações delas. No dia 29 de março, quando o sinal analógico saiu do ar na Grande São Paulo, a Simba decidiu tirar os canais que representa do line up das operadoras, que não aceitavam pagar o valor proposto. Começou “enfiando o pé na jaca”, seguindo estratégia do executivo contratado para negociar. Não era de se esperar que viessem afagos do outro lado.

UM CONFRONTO INÉDITO

É comum ver no octógono, ao final do confronto, os dois lutadores comemorando a vitória antes do anúncio oficial. Uma maneira de pressionar os jurados ou até mesmo de dar alguma satisfação à torcida. O acordo entre a Simba Content e a Vivo TV foi divulgado assim, como uma vitória. Com certeza, uma derrota não aconteceu. Mas a tal vitória também não se evidencia, pelo menos por enquanto. O valor firmado para exibição das programações das três emissoras não foi divulgado oficialmente, mas comenta-se que ficou na casa dos centavos por assinante. Já é alguma coisa, se olhar do ponto de vista de quem não recebia nada. No entanto, do ponto de vista de quem queria receber R$ 15,00, é quase nada. Mas ninguém sabe ao certo, oficial apenas é que a Vivo TV paga um valor por assinante que é “uma vitória” para as emissoras Simba.

Até os direitos do consumidor foram evocados para pressionar as operadoras. O Inadec, ligado ao Deputado Celso Russomano, queria que os assinantes fossem ressarcidos, por terem ficado sem as emissoras Simba. Porém, no mesmo dia do acordo com a Vivo TV, a Anatel negou provimento à demanda.

O bom senso indica que tudo está aberto nessa disputa. Trata-se de uma situação inédita, envolvendo grandes empresas, num momento de muitas mudanças tecnológicas que alteram hábitos do público. Não há precedentes para direcionarem as apostas. O fechamento de um primeiro acordo foi apenas o lance da vez para o jogo continuar. A unidade foi rompida em um dos lados. É de se supor que a Simba vai observar o comportamento da audiência, que poderá dar preferência a uma operadora que tem as três emissoras no line up. As operadoras também devem estar atentas ao comportamento do mercado.

Deve ser nesse ambiente de expectativas que a Simba vai iniciar seus investimentos em novos conteúdos. Aliás, um compromisso assumido pela empresa para fugir da acusação de cartel. Isso deve agregar valor para os contratantes e tornar a grade mais atraente para a audiência. Até novos canais podem ser criados pela Simba, gerando mais alternativas para segmentos específicos de público. Por isso esse movimento do mercado tem tudo para ser saudável para o consumidor. E, se evoluir adequadamente, vai indicar maior maturidade das empresas do setor.

POR UM ENREDO DIFERENTE

O otimismo em relação a esse episódio tem bases, mas também é recomendável. O momento da vida nacional busca esperanças. Práticas antigas atingiram seus limites e agora é necessário que alternativas mais realistas encontrem lugar por aqui. Por exemplo, aquela prática de lucrar com demandas jurídicas precisa deixar de fazer parte do mundo dos negócios. São necessários investimentos em produção, em qualidade e não na busca de brechas da lei para tirar uma bolada.

A Simba é uma joint venture de três empresas de um segmento onde o Brasil construiu um conceito internacional. O audiovisual é uma das indústrias mais rentáveis do mundo e depende muito da criatividade, uma qualidade inegável no cenário verde amarelo. A união dessas três emissoras – geradoras de conteúdo – pode ser a oportunidade para novos negócios, novos empregos de qualidade e maior projeção do produto nacional. Tudo vai depender da capacidade de gestão e de empreendimento por parte da direção de cada uma das emissoras.

Histórias semelhantes nesses trópicos tiveram desfechos desfavoráveis por conta de alguns poucos equívocos. Um deles é a resistência em pôr a mão no bolso, típica daquele perfil de empresário que espera receber tudo do governo, por meio de subsídios, leis de proteção ou incentivo. Nesse caso a ajuda governamental está fora de questão. A torcida é para que os empresários decidam por investimentos e busquem os recursos dentro de suas empresas.

Outra tradicional dificuldade aqui na terra do samba é manter um bom diálogo além da mesa do bar. É importante que as empresas entendam que já percorreram um longo percurso até a constituição da Simba e, em nome de todo esse esforço, mantenham firme o compromisso de parceria. A preocupação maior tem que ser com o sucesso da Simba e não com quanto está ganhando este ou aquele sócio.

Por fim, é indispensável ter toda atenção no front tecnológico. A TV aberta está se tornando um negócio novo, apesar de toda a tradição. Muitas possibilidades tecnológicas ainda não foram exploradas e outras tantas devem aparecer do dia para a noite. São esses alguns dos personagens e ambientes que podem tornar essa “novela” um grande sucesso e dar a ela um glorioso final feliz.

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