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NOVOS TEMPOS, NOVOS VÍCIOS

“Eu queria ser, o seu caderninho

pra poder ficar, juntinho de você…”

A música é dos tempos da Jovem Guarda, autoria de Erasmo Carlos. A composição tem mais de 50 anos. Pudera! Se fosse hoje, o “caderninho” perderia de longe o protagonismo para o celular. O que não é demérito nenhum. Em defesa do caderninho pode-se dizer que, de certa forma, ele pelo menos tem descendentes virtuais no celular, ao contrário de muitos outros tradicionais objetos que simplesmente desapareceram de cena.

Na verdade, nem é tão correto atribuir o fenômeno adicto ao celular. Essa foi a caracterização inicial do primeiro handset, o telefone móvel, um aparelho inegavelmente útil, mas sem potencial para promover tanta dependência. O nome do problema é smartphone, que também é o nome de muitas soluções, sem dúvida. Utilidades e futilidades num só lugar, acionadas pelos polegares, até dominar todo o resto do corpo.

Uma máquina tão polêmica assim “faz xixi na mão de criança”, diriam nos tempos da Jovem Guarda. Objetos complexos nunca são indicados para crianças, a não ser sob supervisão cuidadosa dos pais. É o caso até do televisor, do automóvel e de tantos outros do convívio diário.

O smartphone, em particular, oferece riscos totalmente transparentes para crianças e adolescentes. A OMS – Organização Mundial da Saúde enquadrou numa faixa de risco semelhante à do cigarro. A radiação emitida é nociva para qualquer pessoa a partir de mais de 20 minutos numa mesma ligação. Para adolescentes, e principalmente para crianças, onde novos tipos de tecidos estão em formação, o risco é maior ainda, chega no “contraindicado”.

Nada de novo!? Até aqui, não. Mas a pesquisa Panorama Mobile Time/Opinion Box, divulgada recentemente, apontou que a proporção de crianças com smartphone próprio, na faixa entre 4 e 6 anos de idade, aumentou de 23% para 30% de 2018 para 2019. Consequência natural, caiu de 16% para 10% o percentual das que não acessam nem o smartphone dos pais. Na faixa de 7 e 9 anos subiu de 44% para 50% o smartphone próprio.

Ora, mas a radiação não é um problema que só existe quando o aparelho está ligado a uma linha móvel? É, sim. E essa linha está em 41% dos smartphones próprios de crianças de 4 a 6 anos. Na faixa de 7 a 9 anos esse percentual sobe para 61% e chega a 80% entre 10 e 12 anos. Antes de aprender a falar, crianças aprendem a pedir o smartphone. O dado é de que 40% das crianças com até 3 anos de idade já manifestaram o desejo. Curioso imaginar como isso teria acontecido… Esse interesse chega aos 96% na faixa de 10 a 12 anos de idade.

Os pais, não têm nada a ver com isso. Pelo menos, eles acham que não. A mesma pesquisa indica que só 13% deles acham que, usando smartphones influenciam os filhos. A principal influência viria das amizades dos filhos.

Vamos convir que, de fato, não se pode colocar todo o problema na conta dos pais. O smartphone é um objeto irresistível, é onipresente em todos os ambientes, desde o meio social – seja ele qual for – na mídia, nas conversas entre amigos. Porém, se os pais aceitarem que eles podem ser os principais influenciadores das crianças, pela simples introdução do celular na convivência familiar, já seria um bom começo para corrigir esses exageros.

Falta agora tentar entender para quem o smartphone é mais nocivo, se para as crianças ou para os adultos. (Logicamente, considerando que os benefícios do smartphone são inegáveis, incomparáveis aos malefícios conhecidos.) Trata-se de um fenômeno social de abrangência imensurável, cuja inserção social mais adequada ainda vai exigir muitos estudos e memes.

Por exemplo, no que diz respeito ao tempo perdido. Se considerar a qualidade que poderia ser agregada à maior parte do tempo perdido no smartphone, fica difícil dizer se realmente é compensada com o tempo que o handset economiza em várias tarefas corriqueiras. O smartphone, pelo potencial que possui, acaba sendo um incentivador eloquente do desperdício.

Outra pesquisa, com 6 milhões de usuários anônimos do Avast Cleanup (Android, MAC), entre dezembro de 2018 e junho de 2019 analisou mais de 3 bilhões de fotos e dados. Em média, as pessoas guardam 952 fotos em seus celulares. No Brasil, 17o lugar no hanking mundial, a média é de 911 fotos. As mulheres costumam armazenar 24% a mais do que os homens.

Quase um terço desse total vem pelo WhatsApp. E para cada 5 fotos armazenadas, pelo menos uma é repetida ou de qualidade descartável. Se o peso dessas fotos fosse em gramas, e não em bytes, certamente não suportaríamos tanto desperdício.

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