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GANHAR NA BOLA OU NO GRITO

Tá na cara! O jogador sabia que não dava para alcançar a bola e, mesmo assim, entrou de carrinho, pelas costas do adversário. O juiz vê o lance e, de imediato, pode concluir que a intenção era agredir, não tinha futebol naquilo. É falta desleal, tem de punir, no mínimo um cartão amarelo vai ser aplicado.

A Anatel terá que concluir algo a respeito das intenções da Claro quanto ao atendimento devido aos clientes. Por falhas nos serviços a operadora somou R$ 345 milhões em multas. Para evitar punição pura e simples, a Anatel propôs um TAC – Termo de Ajustamento de Conduta. Um acordo para trocar multas por melhorias, mais investimentos. Parece bom para a operadora e acrescenta algo à sociedade. A Claro, em princípio, aceitou as bases para negociar o TAC.

Na semana passada a Anatel encerrou a negociação. O conselheiro Aníbal Diniz, relator do caso, afirma que “o Grupo Claro não apresenta cronograma de metas e obrigações voltadas à regularização das condutas e, quando aplicável, não apresentou plano de reparação aos usuários atingidos”. A empresa também não preparou o manual para a fiscalização da Anatel acompanhar a execução dos projetos negociados. A operadora nem disse como iria prestar informações periódicas sobre o acordo. As informações são do site Teletime.

A Anatel negociava a construção de novas redes pela Claro, implantação do 4G em 76 cidades com menos de 30 mil habitantes e implantação de fibra ótica em outras 3 cidades. Nos TACs em geral esses investimentos têm de ter VPL – Valor Presente Líquido – negativo, ou seja, sem lucro para a empresa. São em áreas carentes, o “lucro” é social, não no negócio, pelo menos no início. Melhor do que a multa. Afinal, algum retorno, vai haver.

O detalhe: essa história se arrastou ao longo de cinco anos. Por isso é importante que a Anatel tire conclusões à respeito desse longo processo, que pode ter sido apenas uma forma da Claro postergar o pagamento das multas.

RECLAMAÇÕES DOS DOIS LADOS

As quatro grandes operadoras que atuam no país já passaram por tentativas de TACs. Não foi possível fechar nenhum até agora. Isso significa que os serviços prestados não estão bons.

Investimentos em telecomunicações são fundamentais para o Brasil. Pois o território é enorme e tudo está distribuído de forma desigual. A infraestrutura, os recursos, os investimentos, a população, tudo concentrado. Os vários TACs por serviços mal realizados podem tornar investimentos não rentáveis de imediato, em sementes para uma economia local melhor. No futuro podem trazer lucros para essas empresas. No presente, resolvem muitos problemas dessas comunidades.

Neste mês, durante o Painel Telebrasil, a Telefonica anunciou R$ 9 bilhões em investimentos no país, R$ 1 bilhão a mais do que em 2018. Junto veio a reclamação de baixa rentabilidade. De acordo com a empresa, aqui o setor de Telecom é penalizado por obrigações obsoletas, os impostos são altos e há leis restritivas. Não falou só mentiras, mas também não disse só verdades.

Investimentos insistentes com baixa rentabilidade apontam mais para ineficiência dos gestores. Afinal seria difícil acreditar que essas poderosas multinacionais aportam tanto dinheiro só por amor pelo Brasil, para contribuir com o progresso da nação.

Por outro lado há indícios de que não falta dinheiro para elas. Um recente levantamento da WeDo, empresa portuguesa especializada em sistemas de garantia de receita, indica certa falta de atenção por parte das teles que operam por aqui. A WeDo tem mais de 230 clientes em 113 países, para os quais fornece principalmente sistemas capazes de identificar falhas no faturamento. Esses softwares também protegem contra fraudes. E advinha onde encontraram a operadora que mais perdia dinheiro por erros nos lançamentos! Não disseram o nome da empresa, mas foi aqui no Brasil.

De acordo com Rui Paiva, CEO DA WeDo, no geral as operadoras de telefonia perdem de 0,5% a 8% do faturamento por falhas na cobrança, nas contas que mandam para os clientes. Esse caso de 8% teria acontecido por aqui. O valor é astronômico, uma vez que tudo que acontece nessas operadoras está na ordem de bilhões de reais por ano, quando não ao mês. Quem se dá ao luxo de perder tanto dinheiro por falha na cobrança, não deve estar muito preocupado com o pagamento de impostos e outras obrigações.

TEM MUITO PELA FRENTE

Foi nesta semana que o Senado aprovou a nova Lei das Agências Reguladoras (PLS 52/2013). O texto, que só aguarda a sanção presidencial, traz mais seriedade para as instituições encarregadas de fiscalizar serviços tão importantes. Chamou atenção o fato de que o Senado não permitiu indicações políticas para os cargos nas agências reguladoras, que vão passar a ter mais autonomia em relação ao governo.

Os fatos mostram que, por parte da Anatel, não tem faltado boa vontade na hora de discutir as falhas nos serviços. Essa tolerância, no entanto, não parece estar sendo usada para facilitar a correção dessas falhas. As teles têm insistido em deixar as coisas como sempre foram, dando a impressão de que querem testar os limites dos órgãos fiscalizadores.

Se a telefonia móvel já é tão importante para o mundo, vai passar a ser mais decisiva ainda com a chegada de novas tecnologias, como 5G e IoT. Muitos outros serviços vão ser criados sobre as plataformas móveis e a sociedade tende a se tornar cada vez mais dependente de bons serviços de Telecom. O contexto legal do setor no Brasil ainda traz embaraços. Porém, tudo que está sendo exigido pela Anatel, sempre fez parte das regras do jogo e cada empresário do setor teve a oportunidade de avaliar antes de assinar.

Considere-se ainda que as concessões já passaram por prorrogação e nenhuma das grandes operadoras achou que isso foi um sacrifício. Se o PLC 79, ainda em discussão no Senado, pode trazer soluções para o país, também vai acrescentar muito às empresas de Telecom. Será suficiente para que o Brasil passe a contar com serviços do melhor padrão internacional?

Voltando à comparação dentro das “quatro linhas”, o espetáculo aparece quando os protagonistas resolvem jogar bola. Reclamar de faltas pode acontecer uma ou outra vez. Porém, quem insiste em pegar no pé do árbitro, na esperança de resolver todas as dificuldades que o jogo impõe, corre o risco de tomar um cartão ou, pior ainda, deixar toda a torcida muito irritada.

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