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MÍDIA E UMA CERTA MANIA DE GRANDEZA

“O que significa um nerd e um funkeiro fazendo buscas num mesmo serviço de streaming?” Significa que a AT&T comprou a Discovery, em mais uma fusão bilionária no setor.

Se a resposta fosse mais divertida, esse seria exemplo de piada que fazia sucesso há 50 anos. Mas, já que não tem graça, é melhor focar na seriedade da situação. Muita gente está pensando o que levou a AT&T e a Discovery a se unirem para formar um dos maiores players do streaming no mundo. Sim, de acordo com o site Convergência Digital, um comunicado conjunto explicou a transação como o surgimento de “um dos maiores players globais do streaming”. Talvez o nome – que ainda vai ser criado – traga mais pistas do que está por vir.

Uma das hipóteses é de que o novo serviço não vai ter a vocação de fazer ninguém rir. Quer dizer, não estará voltado à diversão pura e simples, à síntese de emoções que envolvem filmes e séries de ficção. Seria um serviço voltado mais para assuntos factuais, com um mix onde o maior peso estaria nos documentários, talvez até com algum novo formato jornalístico. Se confirmado, o desafio poderá levar a uma mudança muito profunda, capaz de mexer nas bases da comunicação de massa.

Quem está acompanhando as mudanças tecnológicas na TV nas últimas décadas, viu as emissoras de sinal aberto sob ameaça de desaparecimento. A mídia especializada acreditava que as TVs por assinatura iriam nadar de braçada na audiência, por conta de maior facilidade para implantação de novos recursos tecnológicos que viriam. No entanto, o sinal digital equiparou a qualidade de som e imagem da TV aberta com as assinadas (cabo e DTH). Os modelos smartTV agregaram a banda larga, aumentando enormemente as opções, que chegam pelo streaming. E, acima de tudo, a TV aberta mostrou maior afinidade com o Jornalismo, o espaço do cotidiano, dos fatos em níveis local, regional, nacional e internacional. É a realidade onde todo mundo vive.

A combinação ficou poderosa: jornalismo e grandes eventos, ao vivo, ficam com a TV aberta, que é grátis e agora tem qualidade digital de recepção; e com as smartTVs, o entretenimento do mais alto nível chega via streaming. Isso levou a TV a cabo americana a perder um Brasil de assinantes nos últimos anos. Ou seja, a redução na base de assinantes foi equivalente ao máximo de clientes que as TVs por assinatura já tiveram no Brasil, quando atingiram a maior audiência por aqui.

No papel, a fusão é da subsidiária WarnerMedia da AT&T com a Discovery. A AT&T vai ficar com 71% da nova empresa, restando pouco menos de um terço do capital para os acionistas do grupo Discovery. Numa análise do que forma os dois conglomerados de mídia temos, do lado da WarnerMedia, CNN, TBS, TNT, Warner Bros, HBO, DC Comics. Vieram com a aquisição do grupo Time Warner, em 2018. Do outro lado, Discovery Channel, Animal Planet, TLC, Food Network, dentre outras, que pouco exibem conteúdos de ficção. Vê-se que o faz-de-conta, as gargalhadas, não são as repostas mais comuns obtidas dessas audiências. O que não deixa de ser um tipo de entretenimento muito atraente, com conteúdos cada vez mais interessantes. São imagens microscópicas exibindo uma natureza invisível, mas exuberante. Robôs gravando cenas no meio dos animais, depoimentos inéditos, impactantes.

O  tipo de Jornalismo que se faz hoje é o mesmo do século retrasado, o mesmo que sempre foi feito no rádio, o mesmo que as TVs sempre exibiram. As pessoas estão mais descontraídas, os textos são mais coloquiais. Mas são os mesmos estilos de reportagens, notícias, editoriais, perfis, talk shows. As informações envelhecem logo, no outro dia tem que repetir tudo de novo. Foi o que migrou para a Internet. Tudo bem, isso não deve mudar. Mas não tem algo novo para apresentar?

Formatos como do Fantástico (Rede Globo) e Domingo Espetacular (TV Record) apresentam as informações mais contextualizadas. São visões mais amplas dos fatos, mais aprofundadas. Um produto que não envelhece tão rápido, poderia passar a ser o jornalismo do streaming, com edições diárias. Essas produções custam mais porém, surpreenderiam até pelo conteúdo que vão apresentar a cada dia. Aquela ladainha cotidiana da política, polícia, esportes, trânsito, clima etc, ficaria para o hard News de sempre, na TV aberta.

O fato é que a fusão anunciada nesta semana fez surgir o segundo maior conglomerado de mídia do mundo, atrás apenas da Disney. Nas mãos da AT&T vão dispor de qualquer meio de telecomunicação que se possa imaginar. As empresas parceiras começaram ganhando no dia do anúncio da fusão. As ações da WarnerMedia subiram 4%, as da Discovery 13%. Será que elas mesmas já sabem o que vão fazer disso tudo? Por enquanto fica um grande “sei lá”, como um refrão, no final de cada conversa.

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