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TIJOLOS, PEDRAS OU SIMPLESMENTE FOGO?

“No que você está pensando?” A pergunta, que seria indiscreta se dita pessoalmente, é um traço da nova cultura que surge sob o nome de rede social. Com essa pergunta, que só se fazia na intimidade de um divã, o Facebook deu dimensão global a uma forma diferente de se relacionar. Um ambiente onde você escolhe a sua própria imagem, escreve o que não fala – ao contrário do que fazem os trambiqueiros – se apresenta ao mundo, se representa. Só faltava a frase tão emblemática se tornar um verso mandarim. Pelo menos foi o que sonhou Marc Zuckerberg, principal acionista do Facebook. Ele foi à China cumprir uma agenda de visitas a líderes do Governo e empresários do setor de Tecnologia. Pretextos pra tentar a liberação da sua marca no país.

Mas, ao que tudo indica, não vai ser desta vez que a frase emblemática vai ter uma tradução ciber social no idioma chinês. Talvez, dizer o que pensa não seja uma boa experiência dentro da fronteira mandarim. Uma preocupação desnecessária, se considerar a experiência concreta na rede social. É raro alguém dizer o que pensa no Facebook, mais raro ainda pensar pra dizer. Quem entra na rede social costuma reagir quase instintivamente contra algumas coisas que aparecem por lá. O que até pode resultar em fenômenos assustadores, se houver razões pra isso.

Ao Facebook é creditada parte da espoleta que detonou a Primavera Árabe, período que incendiou vários países do Oriente Médio e Norte da África. A outra parte da espoleta – possivelmente a maior – foi a miséria e os desmandos sobre aquelas populações. Coisas que, aparentemente, não existem na China. O risco, até agora, parece ser administrável.

NA VERSÃO BRASILEIRA…

No Brasil de hoje o Facebook também está causando. A temperatura política só aumenta o “barulho das panelas” de um perfil pra outro. Na busca de culpados, tanto pró, como anti, vão dos versos às tragédias gregas para se acusarem. Um fenômeno que revela um lado das pessoas que dificilmente seria visto fora do ambiente cibernético. Aqueles personagens que nós controlamos na rede social são capazes de acreditar em argumentos absurdos, divulga-los, dizem meias verdades para confundir e se ofendem por muito pouco. Não seria assim pessoalmente. A tradição familiar, que chegou a colocar uma “grande sala” para parentes trocarem mensagens pela rede, foi rompida como nunca antes. Apoiadores de um dos lados, indignados com o posicionamento contrário de outros familiares, deixaram subitamente grupos fechados que reuniam famílias. E estenderam o boicote até para o almoço no fim de semana, casamentos, festas de fim de ano.

A interface eletrônica não carrega muito do que apresentamos numa mensagem pessoal. “-Você acredita que ele é honesto?” é uma pergunta que, pessoalmente, pode ser feita com uma voz serena, com uma expressão facial receptiva, de quem aceitaria qualquer resposta, talvez com um suave toque no ombro. No “post” não vai nada disso. Do outro lado, quem lê a pergunta acrescenta os temperos que quiser. Por vezes, destempera.

À ESPERA DE UMA RESPOSTA

Para o CEO do Facebook, tudo isso é lucro. Polêmicas levam às alturas a frequência da rede social. Quanto mais pessoas, melhor. Ao chegar à China, onde está um sétimo da população do mundo, ele exibiu o sorriso que certamente moldou por algumas semanas com sua equipe de marketing. Correu na histórica Praça da Paz Celestial, jurou toda a felicidade do mundo, mesmo respirando um ar com nível de poluentes acima de dez vezes o admitido pela Organização Mundial da Saúde. Um risco concreto, que lhe valeu um puxão de orelhas de uma cidadã chinesa, a própria esposa. Mas os sorrisos e a bajulação não saíram de cena.

O que Zuckerberg quer do Governo Chinês vai além da Muralha da China. Ele quer derrubar o firewall, o implacável “muro de fogo” que praticamente impede o Facebook de entrar naquele país. É o mesmo impedimento imposto ao Twitter. Zuckerberg até que foi longe. Conseguiu uma reunião com Liu Yunshan, o responsável pela propaganda oficial chinesa, que não costuma se reunir com estrangeiros capitalistas. Membro de peso no Marxismo Chinês, Liu não disse o “sim” que Zuckerberg queria ouvir, mas também não repetiu enfaticamente o não, que prevalece. Teria, por enquanto, sugerido que o Facebook partilhasse o seu conhecimento, experiência e dados para ajudar o desenvolvimento da Internet no sentido de beneficiar as pessoas de todos os países.

Por enquanto, a viagem de Zuckerberg está rendendo gozações na Internet. Mas a persistência aliada a bilhões de dólares está se mostrando uma força irresistível no mundo todo. Os comunistas mais bem sucedidos na escala dos capitalistas, possivelmente estão pensando uma maneira de levarem vantagem em cima do deslumbre mal disfarçado do CEO americano. Com certeza, todas as apostas continuam em torno da célebre frase, que Zuckerberg faria de tudo para que o Governo Chinês respondesse: “-No que você está pensando?”

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