sexta-feira, 22 de julho de 2016
“A política brasileira é um grande Fla x Flu…” A referência ao clássico do futebol carioca é um antigo sinônimo de briga entre grupos no Brasil. Uma situação que não aceita meio termo, no estilo “ou é contra ou é a favor”, impossível a neutralidade. Em São Paulo a rivalidade entre palmeirenses e corintianos também serve à mesma figura de linguagem, embora não seja tão popular. O curioso é que, nos dois casos, os aparentes opostos são mais ou menos uma coisa só, se forem levadas em conta as origens históricas. Tanto o Flamengo surgiu de dentro do Fluminense, foi “feito da costela” do rival, como a torcida palmeirense tem muitos ancestrais corintianos.
No fundo, no fundo, foram feitos um para o outro. O que seria do futebol do Rio de Janeiro sem o fervilhante Fla X Flu!? Um tédio. Corinthians e Palmeiras também são o auge das festas de torcidas paulistas. Se complementam, assim como no Livro do Gênesis a costela da primeira criatura deu origem ao Ser que completa a existência humana. Sem pôr nem tirar, o exemplo serve para TV aberta, TV por assinatura e o VOD – Video On Demand, a “TV” que a gente constrói usando a Internet. Uma surgiu da outra, se complementam para a alegria da sociedade urbana ocidental. Não falta nem o detalhe da rivalidade que marca a disputa entre esses serviços. Principalmente depois que o sinal digital elevou a TV aberta a outro patamar de qualidade. Em seguida veio a plataforma smart TV e pronto! O VOD colocou cabelos brancos na TV paga.
Na real, não é bem assim. Os dados do mercado brasileiro mostram que, até o momento, as TVs não estão se “canibalizando”. Fiéis às origens, ocupam espaços específicos, respeitando a vontade do consumidor.
FELIZES PARA SEMPRE
Quem tem boas estatísticas são as TVs pagas. Elas tem condições de acompanhar cada movimento do consumidor e por isso coletam dados com facilidade. De acordo com Renata Policicio, da área de pesquisa da ESPN, no Brasil a TV convencional, que tem uma programação pronta numa grade (TV linear) “não está caindo, mas o WatchESPN (plataforma online da programadora) tem batido recordes a cada mês. Quanto mais opções a gente dá, mais tempo o assinante passa consumindo conteúdo”. Ainda no universo das TVs pagas, Fernando Magalhães, diretor de programação da América Móvil Brasil, constatou um aumento da audiência da TV linear no último ano. Para ele, é o on demand (VOD) que está ajudando a vender o linear: “-Boa parte da venda dos pacotes a la carte do Telecine ou da HBO é feita pelo controle remoto, quando o assinante tenta ver um conteúdo ao qual não tem direito através do Now”. Ele acredita ainda que, nos dias de hoje, a venda do serviço de TV depende diretamente da oferta do VOD e da alternativa de acesso por qualquer plataforma (everywhere), evoluções recentes no setor.
Um detalhamento mais claro dessas tendências do consumidor foi apresentado recentemente por João Mesquita, CEO do Telecine: para assinantes que contam com as 3 alternativas a seguir, o linear representa 61% da audiência; o VOD online, que exige um outro equipamento conectado à Internet para baixar, é a preferência de apenas 4% dos assinantes. Mas pelo set-top box, aquela caixa que fica na casa do assinante, o VOD fica com 35% da audiência. Ou seja, o telespectador se confirma como um animal sedentário. Ele não quer complicação para consumir vídeos. Por isso o aplicativo da Telecine já está nas smart TVs da Samsung e da Sony, com promessa para breve em televisores da Panasonic, LG e Phillips.
As TVs pagas acreditam que o pior da crise já passou. Para elas os assinantes, que hoje só representam 30% da audiência de TV como um todo (70% só sintonizam TV aberta), ainda vão aumentar muito. A melhora na infraestrutura das TVs por assinatura e até o aumento do nível de escolarização da população, estariam ajudando a vender canais pagos. A banda larga, segundo dados, estaria alavancando as TVs via fibra ótica, que as operadoras de telefonia estão oferecendo. Isso pode ter a ver com as dificuldades que o DTH enfrenta, possivelmente por não oferecer Internet.
A NATUREZA E SUAS VARIEDADES
Talvez algum dia a ciência comprove que vídeo é uma das necessidades fundamentais da espécie humana. Enquanto isso não acontece, as mais variadas experiências confirmam que, no mínimo, é um grande negócio. Produzir vídeo é trabalhar para uma demanda ainda imensurável. Principalmente depois que os algoritmos do Google passaram a garantir receita para qualquer produtor que gere muitos cliques. Tem de aulas de culinária até os humorísticos. Os OTTs, como o Netflix, atualmente são a principal preocupação das TV pagas, que incluem no VOD serviços similares, com filmes e séries.
Por outro lado, o que a ciência já sabe há muito tempo é que somos animais sociais. Precisamos conviver com pessoas, conhecer nosso território, nossa comunidade. Tecnologias com esse potencial – as redes sociais – são tratadas como fenômenos surpreendentes, quando simplesmente confirmam um perfil da espécie. É o que se passa no Facebook, Instagram, WhatsApp, pra citar apenas alguns exemplos. No contexto de televisão é o que está acontecendo com as emissoras abertas. Elas estão aproximando as comunidades, agora com muito mais facilidade para entradas ao vivo, muito mais qualidade de som e imagem e total fidelidade do sinal. Tudo bem, sempre vai sobrar algum espaço para TVs pagas. Mas, com certeza, não vai ser mais nas dimensões que se viu nos Estados Unidos, na casa dos 85% dos domicílios. Lá, muitos entre os consumidores mais exigentes do mundo, estão deixando os canais pagos e compondo o VOD com a TV digital aberta. É ela que está se confirmando a “variedade mais resistente” entre os serviços de vídeo.
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