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HUMANISMO E HUMANADAS NO CIRCO HI-TECH

Se você não tem uma resposta para a seguinte questão, pergunte a um comediante: “-O que leva uma pessoa a passar uma noite fria de outono na rua, em Nova York, esperando abrir a loja da Apple para comprar um iPhone X?” A resposta dele deve ser engraçada. Mas se você quiser uma resposta mais divertida e criativa, talvez o melhor seja perguntar a um psicólogo freudiano.

Não que os psicólogos sejam palhaços, é o comportamento humano que está ficando mais engraçado. Ou mais triste, para os pessimistas. Com certeza, está mais verdadeiro, na medida em que a gente se conhece mais. São halter egos ocultos que representamos, num faz-de-conta tosco em que o mundo virtual nos recebe. Nos videogames, por exemplo, já fugimos do Pacman, passamos pela ingenuidade do Super Mario Bross, pela crueldade de lutadores monstruosos, até pela habilidade do Neymar. Atitudes estranhas? Faz tempo, mas você já riu de alguém falando alto e gesticulando na rua só para mostrar que está ao telefone celular. Se é que não foi você o próprio personagem.

Para quem presta atenção, as redes sociais sempre trazem novidades sobre o comportamento humano, que também inclui “humanadas”. Ou, o humano em manada. Faz parte do ser social, inteligente ou não. Na Internet, o efeito surge da combinação de extremos, onde se tem a máxima privacidade da sua tela, para interagir em meio a uma mega manada.

Isso leva muito além do frio na quinta avenida, dos US$ 999,00 pagos pelo iPhone X, ou dos US$ 250,00 que uma brasileira pagou só por um lugar na fila. Chega aos tomógrafos parados na manutenção ou na linha de fabricação, por falta de memórias digitais.

Lenda cibernética ou não, é o que corre na “rádio peão” dos varejistas do setor. A demanda da Apple e consequente reação dos concorrentes enxugou a oferta de memórias digitais utilizadas para fabricar uma infinidade de outros aparelhos digitalizados. Fala-se que a mordida da maçã, desta vez, chegou a 100 milhões de iPhones X para inundar o mercado. As cotações das ações da empresa na Nasdaq subiram a ponto de aproximar o valor total da Apple ao estratosférico US$ 1 trilhão. “Vox Populi, vox Market”.

CIÊNCIA COM FRONTEIRAS

Pode ser folclore, mas a verdade é que hoje, de fato, faltam memórias digitais para fábricas dos mais diversos segmentos. E é aí onde outra realidade humana se revela.

A fabricação de memórias e outros componentes digitais está altamente centralizada. Muitos desses endereços estão na Ásia. A geopolítica da alta tecnologia está setorizando a produção dos componentes mais sofisticados.

Possivelmente pelo fato de que as instalações industriais para produzir esses componentes são extremamente caras. Isso leva à necessidade de produção em escala global para fazer frente aos custos de fabricação. Por exemplo, todas as telas que disputam as atenções dos seus olhos são fabricadas na Ásia. Do celular ao wallTV, aquela do elevador, a tela de propaganda no vagão do metrô ou do ônibus. Resultado de uma política de estado adotada pelo Governo Japonês nos anos 70, que apostou nas telas LCDs e similares.

A geopolítica da alta tecnologia também tem razões menos nobres. Além da mão de obra mais qualificada, tem que ser mais barata e bem comportada. Nações com tensões trabalhistas mais frequentes representam um risco em cadeia. Tanto faz se essa estabilidade se sustenta em relações de trabalho mais justas ou se vai na base da pressão governamental, como se vê na China.

Aliás, a fábrica de memórias que está abastecendo a Apple e desabastecendo as outras indústrias fica na China. Na década passada, por conta dessa mesma centralização, um incêndio em uma fábrica chinesa de componentes de alto valor agregado impactou os custos de toda a indústria de bens digitalizados.

O Brasil faz parte dessa cadeia. Porém, pela grande oferta de mão de obra barata. Grandes marcas de celulares enviam componentes para fábricas no Brasil, para serem montadas dentro do aparelho. Mais ou menos como se “fabrica” televisores na Zona Franca de Manaus. Passa pelos dedos ágeis de operárias e operários brasileiros e recebe a pequena inscrição “Made in Brazil”. E assim marcamos presença na indústria do futuro, ainda que o Governo Federal tenha reduzido pela metade os investimentos em tecnologia, neste ano e para 2018. E agora, o que é mais contraditório? As prioridades orçamentárias do Governo ou a fila do iPhone X?

EM BUSCA DE SOLUÇÕES

São essas contradições nacionais que não se ajustam à lógica de um mundo em que inovar e produzir convergem para o mesmo significado. Hoje produzimos, amanhã estamos projetando e, depois de amanhã, a sorte está lançada. Quem inovar mais fica com as fichas da mesa.

O ritmo das mudanças está pautando a economia. Lembra quando carro de rico era Mercedes? Televisão de ponta já foi Telefunken, relógio moderno era japonês e até celular era monopolizado pela marca Motorola. Tudo isso mudou. Por quanto tempo o Windows será o sistema operacional dominante? A grande questão nem é o que vai cair, mas sim o que virá para ocupar os novos lugares.

O Brasil está a 25 anos de se tornar uma das nações mais poderosas do mundo. Assim como estão todos os outros países, uma vez que esse tempo é suficiente para investir na Educação – o que inclui Ciência e Tecnologia – e formar uma geração de cérebros inovadores.

Como essa “fórmula científica” é conhecida há muito tempo e repetida insistentemente, a prática que nunca aconteceu pode começar agora pelo mundo virtual. Quem sabe pela experiência acumulada em jogos como o Simcity, onde o jogador assume o papel de construtor e gestor de uma cidade. Ou mesmo utilizando a inteligência artificial, como um grupo brasileiro fez para acompanhar as contas de deputados federais.

Eles desenvolveram um robô que acompanha os reembolsos que a Câmara faz aos seus integrantes, mediante apresentação de notas fiscais de despesas individuais. Com base em vários bancos de dados que “instruem” a verificação, o software separa as notas fiscais suspeitas, tipo tapioca que custa R$ 250,00. Depois, as mais suspeitas são analisadas por auditores humanos. As irregularidades encontradas somam quantias estarrecedoras. Mais impressionantes ainda são as explicações dos deputados.

Não é preciso muita inteligência para fazer melhor pelo país. Um robô mais eficiente até que poderia ser candidato em 2018. O marqueteiro da campanha provavelmente mudaria o nome para bot, já que foneticamente “robô” é muito associado aos políticos mais tradicionais.

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