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SEU VOTO INCONSCIENTE APURADO PELA INTERNET

Se você procura um candidato que diga exatamente o que você quer ouvir, prepare-se. Vão aparecer aos montes. Isso não significa, necessariamente, que se eleitos, vão fazer o que você espera. O avanço vai ser na “afinação do discurso” do candidato com o eleitor. O que era feito na base do feeling de marqueteiros caríssimos, está passando a ser objeto de ferramentas cibernéticas muito mais precisas.

Tudo começa pelo seu perfil em alguma rede social. É muito pouco sobre você, mas é uma amostra representativa do personagem que você é para o mundo exterior. O cidadão que assina seu nome. É ele que entra na cabine indevassável com o seu voto.

Aquelas inúmeras experiências de vida, suas preferências, seu passado e seu presente, sua intimidade, são algumas das partes da sua essência que se combinam na sua mente. Atuam em processos naturais conhecidos, ou ainda inatingíveis para a ciência. No fim projetam algumas marcas no seu personagem social, o bastante para revelar boa parte do seu pensamento como eleitor. Bingo!

Nesse garimpo de preciosos votos, outros veios reluzentes estão pelas cavernas big data. Alguma vez você leu os famosos “termos e condições” que assina com um clique em endereços pela Internet? Pois é, há um grande vazio jurídico sobre como os dados pessoais que você coloca lá podem ser usados. Isso quer dizer que aquela contida e resguardada “privacidade”, que você tanto preza, está quase tirando a calcinha. É por esses caminhos onde a inteligência artificial avança e descobre muito mais sobre comunidades cada vez maiores.

Tente lembrar quantas vezes você falou sobre o comportamento do eleitor americano. Quanto a mídia brasileira já discorreu sobre o perfil daquele povo. Sabem de nada, inocentes! Lembre agora da surpresa que lhe causou a eleição de Donald Trump. O uso dessas ferramentas cibernéticas é apontado como um dos principais recursos na vitória do milionário. Mais especificamente, sob a gestão da empresa Cambridge Analytica, que está chegando aqui no Brasil e promete perder o sotaque em muito pouco tempo.

“NÃO SOU PRÉ-CANDIDATO A NADA”

João Dória, atual prefeito “não político” de São Paulo, é cliente da “Social QI”, uma jovem empresa que trabalha como integradora de 5 softwares de monitoramento ligados a imensos bancos de dados. O publicitário Daniel Braga, que há dois anos trabalha diretamente com Dória, é um dos sócios. Ele afirma que monitora a repercussão de tudo que o prefeito fala.

Há uma verdadeira cadeia tecnológica nesse tipo de trabalho. War Room, por exemplo, é o sugestivo nome de um programa que Daniel utiliza para rastrear as redes sociais. Faz parte de um serviço oferecido pela startup brasileira “Stilingue”, cuja pontaria é afinada por 35 desenvolvedores que ficam em Ouro Preto – MG.

War Room é capaz de procurar tudo que é publicado sobre qualquer assunto na imprensa. No conjunto de atividades denominadas “gestão de imagem” para políticos, o software procura aquele nome em redes sociais como Facebook, Instagram e Twitter. Com ferramentas de reconhecimento de imagem busca os memes de interesse que estão na rede. E ainda faz a “psicometria”, a tal da análise dos perfis que vai muito além de idade, sexo, instrução, “direita” ou “esquerda”.

Nesse imenso universo de informações os analistas de dados mandam o programa buscar o que julgam importante para as suas conclusões. E, a partir do cenário obtido, orientam o discurso do político. Segundo Braga, nada disso é para mudar a plataforma do candidato, simplesmente ajuda o candidato a “falar da melhor forma” o que pensa, “para ele ser bem entendido”.

No caso de Trump, a psicometria teria sido usada para a “análise de sentimento”. O programa rastreou manifestações espontâneas nas redes sociais que permitissem inferir sobre medos, anseios e alguns outros sentimentos considerados importantes para aquele momento nacional. Isso permitiu uma certa transversalidade no discurso do candidato, que conseguiu sensibilizar eleitores de esquerda ou de direita, ao tratar, por exemplo, de medos frequentes entre a população.

War Room foi desenvolvido com base no processamento de linguagem natural. Os desenvolvedores alimentam permanentemente o sistema com textos em português, para que ele identifique padrões comuns e assim possa entender o idioma e até interpretar mensagens.

Rodrigo Helcer, um dos sócios da Stilingue, citou um exemplo de eficiência no uso adequado do sistema, relacionado ao monitoramento do Congresso Nacional. O caso específico foi a votação na Comissão Especial da Câmara dos Deputados para a reforma da Previdência. Com base em manifestações e entrevistas dos 37 membros da Comissão, o sistema previu como eles votariam. Errou apenas dois votos. Helcer afirma que a redação de um jornal de grande circulação em São Paulo havia consultado, por telefone ou e-mail, todos os membros da Comissão, para saber como votariam. A prévia publicada pelo jornal errou 4 votos.

SABE COM QUEM ESTÁ FALANDO?

Quem gosta de usar as redes sociais para discutir sobre política partidária já deve ter levado altos papos com robôs. Os chamados social bots são perfis nas redes sociais conduzidos por inteligência artificial. Segundo o Prof. Fabricio Benevenuto, da UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais, esses programas são utilizados até para espalhar informações falsas. Eles também debatem com internautas reais para colherem impressões importantes para a elaboração de estratégias políticas.

O professor conta que em um experimento, em 2013, seu grupo na universidade criou 120 desses perfis no Facebook e no Twitter. Robôs, inteligência artificial que começou a interagir com pessoas na rede. Alguns foram bloqueados por internautas. Outros desses bots, porém, conseguiram mais interesse do que celebridades do porte de Justin Bieber, conforme apontou o medidor Twitalyzer.

Atualmente Benevenuto trabalha no Instituto Max Plank, na Alemanha, mas também é consultor da Stilingue. Ele apoia o núcleo que está encarregado de detectar e filtrar bots na rede. Um cuidado importante para quem quer apurar as manifestações virtuais mais autênticas.

É por conta de tecnologias desse tipo que o Prefeito “não político” e agora, “não candidato”, através da página pessoal dele no Facebook, conseguiu interagir com 23,5% dos 114 milhões de brasileiros usuários únicos da rede social. De acordo com o Daniel Braga, entre 7 possíveis presidenciáveis monitorados, o segundo lugar ficou com Jair Bolsonaro, com 7,1% de interações.

Mais uma vez, prepare-se! “Voto eletrônico” vai passar a ser um novo conceito. E “plataforma política”, que nunca significou muita coisa aqui no Brasil, deve passar a ser um item poderoso nas campanhas eleitorais.

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