sexta-feira, 29 de julho de 2022
Macaulay Culkin, Sandy & Júnior, Miley Cyrus, Demi Lovato, Neymar Jr., Malu Magalhães, Justin Bieber, … Todos fizeram sucesso muito cedo, na infância ou pré-adolescência. Todos confirmaram seus talentos especiais na vida adulta. Mas nem todos conseguiram sustentar o sucesso enquanto gente grande. As razões mais visíveis, nos casos de declínio do estrelato, são as drogas, álcool e outras ditas “brincadeiras” perigosas que se aproximam precocemente desses ídolos empoderados. Porém, as razões mais profundas, muito poucos talvez saibam.
Casos de sucesso em geral causam uma enorme ansiedade que, de alguma forma, acaba atingindo grande parte dos que observam. Até onde vai nesse ritmo? O que há de tão especial? Saberá gerir todo esse sucesso? O que pode estar por trás de tanta ostentação?
Há uma série de discursos prontos para o caso de parte do sucesso virar escândalo. Porém, mais uma vez, as razões mais profundas, talvez nem os próprios atores venham a saber. A Netflix é um caso presente. Depois de 10 anos crescendo e surpreendendo o mundo inteiro, viu seu gráfico se curvar discretamente. Os discursos prontos foram disparados em todas as direções, enquanto a empresa reage com sólida maturidade. Quando anunciou a perda de 200 mil assinantes no último mês de abril – foi o primeiro trimestre de queda da história da empresa – preveniu o mercado de que nova baixa deveria acontecer no próximo trimestre. Estimou uma queda 10 vezes maior, de 2 milhões de assinantes. O mercado de ações precificou a previsão, reduzindo bastante as cotações. Agora, no segundo trimestre de encolhimento, a redução foi bem menor que a previsão. A perda ficou em torno de 970 mil assinantes. O efeito foi uma retomada dos preços das ações, mesmo diante de uma queda expressiva.
A despeito das muitas especulações do mercado, nada indica que a empresa esteja em direção a uma derrocada. A Netflix inventou não apenas um negócio de muito sucesso, mas toda uma vertical que está mudando a história do entretenimento. Foi algo tão espantoso que a reação da concorrência demorou a se esboçar. O que está acontecendo mais parece a canibalização natural de parte do sucesso que a própria Netflix inventou. Mesmo que ela venha a ser superada por alguma adversária, deverá continuar concorrendo ao primeiro lugar. Uma alternância que faz parte do mundo dos negócios.
O que pode, sim, fazer grande diferença, é o mesmo fator que fez surgir a vertical consolidada pela Netflix: a tecnologia de streaming. Depois do blue ray, enquanto a indústria projetava novos suportes para conteúdos audiovisuais, a Netflix viu no streaming tudo que precisava para alçar um voo de águia. E assim fez. O que virá agora? Será que grandes conteúdos vão chegar pelas tampinhas de refrigerantes? O 5G e suas inúmeras possibilidades, o que podem mudar nesse jogo?
Por enquanto, a possibilidade mais concreta está em outra tecnologia, já criada, voltada a um modelo de negócio de sucesso, adaptável ao streaming. É o AVOD – Ad-supported Video On Demand, ou o streaming de vídeos com publicidade. A Microsoft é a parceira tecnológica para fazer essa combinação complicada. Anúncios com endereços certos, de acordo com os perfis estimados por algoritmos. Matéria publicada no site Digital TV Europe informa também que, em cinco países, começou nesta semana a funcionalidadeo “adicionar uma casa” na Netflix. A ideia é reduzir a pirataria por compartilhamento de senhas.
No entanto, analistas consideram que o esforço de vendas ainda é pequeno. Os concorrentes regionais, como o Viaplay, da Suécia, estão ganhando espaço em suas respectivas regiões e tomando coragem para avançar para novas áreas; o esporte, segmento muito atraente, ainda não está nos planos da Netflix; outros grandes concorrentes oferecem vantagens acessórias, como os serviços de entregas rápidas que a Amazon estende para clientes do streaming. Até a estratégia de estimular o consumo compulsivo, com o lançamento de séries completas, pode estar se esgotando. Já não é mais novidade.
Outro fator arriscado, no qual a Netflix estaria se apoiando para fazer planos, é o fim da TV linear. Difícil imaginar que a passividade dos momentos no sofá seja substituída pela necessidade de personalização de cada consumidor de vídeo. Eles teriam de ter, então, listas de vários filmes e séries na cabeça, para os assistir em horários previstos em suas agendas. Afinal, quem tem uma vida pessoal tão organizada?
A Netflix é hoje uma gigante que cresceu estudando, inventando, produzindo e vendendo histórias. Seria irônico se agora ela fosse abalada pelo que a história real cobra das apostas feitas em previsões equivocadas.
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