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NO MEIO DO JOGO, TENTANDO ENTENDER

É como assistir a um jogo de xadrez. Um jogador movimenta um peão e aquela jogada parece aleatória. Poderia ser aquele peão, poderiam ser várias outras peças, não mudaria em nada. Engana-se! Aquele passo, daquele peão, está cheio de motivos, por enquanto, invisíveis. A estratégia só vai se revelar no futuro, e aquele simples movimento vai passar a fazer sentido.

Quem acompanha o que vem acontecendo com a operadora Oi fica com a sensação de que está diante de um tabuleiro. Fatos aparentemente desconexos, depois de algum tempo, se encaixam quase que numa relação de causa e efeito. Coincidência? Pode ser. Mas também pode não ser e é isso que o tempo vai dizer.

Nem havia muito tempo do 7 x 1 e a dívida da Oi começou a ganhar notoriedade na mídia. Não era para menos, passava de R$ 60 bilhões. Na época, o orçamento de apenas 3 estados brasileiros era maior do que essa dívida. A Anatel tinha em haver R$ 20 desses bilhões, por conta de penalizações relacionadas à má prestação do serviço. Uma dívida que, pela origem pública, não poderia entrar na recuperação judicial. O juiz incluiu. As coisas caminharam assim, entre porquês inexplicáveis: por quê o serviço da Oi caiu tanto? Por que os despachos dos juízes tratavam de riscos e conveniências econômicas, quando deveriam citar leis? Por que havia tantas brigas entre executivos da Oi? Por quê parte dos acionistas demonstrava interesse na falência da Oi?

A recuperação judicial saiu e com ela muitos bilhões de reais desapareceram do passivo da empresa. Brigas e mais brigas na justiça, mas a Oi conseguiu formar uma nova diretoria. A esperança era de que tudo acabaria bem. De fato, parece que está acabando bem, mas não para a Oi. Toda a dívida está negociada e o filet mignon da empresa, a operação móvel, está a venda por R$ 15 bilhões. Nesse preço está incluída boa parte dos bilhões que as concessionárias ganharam de presente do Congresso em 2019. Estima-se que cerca de R$ 100 bilhões em bens reversíveis passaram da Telebrás para as empresas que arremataram as antigas subsidiárias. A primeira oferta vinculante de compra da Oi logo apareceu. Quem apresentou? As três operadoras, ditas concorrentes, Tim, Claro e Vivo. O mercado percebeu de pronto os ganhos desse tom harmonioso para os caixas dessas concorrentes. As ações tiveram forte alta por aqui. No Exterior, as ações das estrangeiras que controlam as operadoras aqui no Brasil, também subiram em todas as bolsas, segundo apurou o site Teletime.

Tudo tão na medida que parecia até uma armação. Não demorou uma semana para que se ouvisse um estrondo, como se viesse do alto dos céus. Uma empresa que aluga redes e torres para o mercado de telecomunicações, a Highline, fez uma oferta de maior valor pela Oi. As ações da Oi subiram de imediato, e bastante, uma vez que passou a ser mais disputada. Tim e Vivo caíram porque tentaram apresentar uma contraproposta, mas não conseguiram ainda o apoio da Claro, a maior entre as três do grupo. Até pelas dimensões do grupo no Exterior, a Claro pode ter percebido que terá outro papel, num momento em que a disputa ganha contornos diferentes no mercado.

A Highline originalmente foi fundada no Brasil, pelo grupo Pátria Investimentos, em 2012. A empresa fornece soluções para infraestrutura de redes sem fio. É como ser dona de uma estrada de ferro e alugar para empresas que tenham trens para explorar comercialmente o trecho. As quatro teles nacionais são clientes da Highline. Porém, no final do ano passado, a empresa foi adquirida pela americana Colony Capital Inc, na verdade, a real interessada nos ativos da Oi. A Colony é do polêmico empresário americano Tom Barrack, que já foi um grande amigo de Trump. Hoje, a relação estaria abalada.

Por enquanto, o discurso é de que a Highline estaria interessada na Oi apenas para poder locar as redes da empresa para as concorrentes. A carteira de clientes seria negociada entre as teles. Especula-se também que a Algar poderia ficar com os clientes. Porém, esse novo modelo de negócio, inédito no mundo e ainda não aprovado pela Anatel, chegaria derrubando os preços nos leilões de espectro, realizados pelo governo. Poderia até reduzir os investimentos em redes, tão importantes para o país. Ou seria apenas um disfarce para entrar de vez no varejo das operadoras? Há quem acredite ser apenas uma agitação artificial, para acelerar o mercado financeiro nesse período de incertezas. Curioso é que, no ano passado, quando os congressistas preparavam a doação de patrimônio para as teles, apareceu do nada a proposta de tornar definitivas as faixas de espectro para as operadoras, que normalmente precisam ser renovadas em leilões periódicos. Agora, cai como uma luva, não é!?

Na prática, o que se vê é um dos efeitos de se ter, num país continental como o Brasil, somente empresas estrangeiras atuando num setor tão estratégico como as telecomunicações. Eles formam uma massa de ativos que nenhuma outra empresa brasileira tem cacife para fazer frente. Numa hora dessas, em meio a mudanças, o mercado financeiro fica refém das oscilações que esses fatos provocam a cada pregão.

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