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BIG TECHS ROMPEM SILÊNCIO E CONTESTAM ANATEL

Nem público, nem privado. O que se pretende implantar agora é um novo sistema de gestão apelidado de fair share (algo como “compartilhamento justo”). Esse sistema faria com que determinado segmento de negócios operasse sem riscos típicos do setor privado, ao mesmo tempo que contaria com vantagens do setor público. Teria até “contribuintes” próprios. Nesta semana essa polêmica levou às alturas o embate entre as chamadas big techs e as big teles – as grandes operadoras de telefonia – que querem implantar o fair share no Brasil.

O fair share é o nome dado pelas operadoras de telefonia para o sistema onde os grandes usuários da Internet passariam a pagar um valor a mais pela conexão. As operadoras argumentam que uma big tech como a Netflix, por exemplo, congestiona o tráfego da rede para entregar filmes e séries. Mais de metade do tráfego da Internet fica por conta, além da Netflix, de gigantes como Facebook, Amazon, Disney, Apple, WhatsApp, Tik Tok, LinkedIn, … Pelo novo sistema todas essas empresas teriam de pagar a mais para as operadoras de Internet, que teriam de “ampliar suas redes”.

Faz tempo que esse pleito vem sendo apresentado pelas big teles aos órgãos reguladores em vários países. Elas querem que as nações obriguem as big techs a pagarem pela expansão das redes. Na última terça-feira a Anatel abriu publicamente os argumentos apresentados aqui no Brasil sobre o assunto, na Tomada de Subsídios 13 da Anatel.

A Conexis, entidade que representa as grandes operadoras de telefonia no Brasil, afirmou que espera “… assegurar que a Anatel estabeleça a obrigatoriedade de compartilhamento de custo em infraestrutura de redes entre detentoras de infraestrutura e grandes usuários (as big techs) …” Segundo a entidade, isso aconteceria com o “… estabelecimento da obrigação para os usuários massivos …(big techs)… realizarem livre negociação com as prestadoras …(big teles)… , celebrando acordos comerciais que determinem uma remuneração justa … pelo uso das redes das operadoras de telecomunicações”. O objetivo seria a sustentabilidade das operadoras.

A entidade representativa das big techs (Facebook, Google, Amazon, TikTok, Twitter, …) no Brasil é a Câmara e-net. Lembrou que sem indícios de “violações sistêmicas” aos direitos dos consumidores dos serviços de telecomunicações, a Anatel não tem competência legal para agir. Ela não regula a Internet no Brasil. E acrescentou que, se a Anatel pudesse regular os clientes das empresas de telecomunicações, teria poderes para intervir em toda a economia. Afirmou ainda que, se houvesse lei nesse sentido, a Anatel não poderia sequer impor “obrigações de investimentos”. Afinal, os serviços são prestados em regime privado, não como concessões. Então quem poderia garantir que as prestadoras usassem o dinheiro arrecadado para expansão de redes? Por outro lado, a Câmara e-net considerou que, se as operadoras querem “diferenciar usuários”, poderiam atender famílias carentes com “tarifas e preços razoáveis”, como consta do artigo 2o. da LGT – Lei Geral das Telecomunicações.

O diretor de Investimento e Inovação do Ministério das Comunicações (MCom), Pedro Lucas da Cruz Pereira Araújo afirmou que o ministério não cuida dessas questões regulatórias. Mas acompanha o impacto financeiro relativos às políticas públicas de conectividade. Sendo assim, considerou que “grandes usuários” induzem “… uma necessidade de investimento muito grande pelas prestadoras de serviço de telecomunicação, e eu acho que a gente pode sim avançar em uma discussão sobre ampliar o pool de contribuição”. Já a Câmara e-net afirma que as operadoras cuidam apenas do acesso na ponta. Antes disso há toda uma infraestrutura das big techs que inclui cabos submarinos, data centers e CDNs. E esses investimentos aliviam o trabalho das operadoras.

Se, no Ministério das Comunicações, o Diretor de Investimento e Inovação defende a cobrança sobre o tráfego massivo, a ISOC – Internet Society, afirma o contrário. Trata-se de uma entidade internacional que participou do debate. Ela cita uma experiência desse tipo que está ocorrendo na Coreia do Sul. Lá, estaria gerando riscos de concentração de mercado e de “… efeitos adversos na economia e no desempenho da rede”. Para a entidade, a negociação de cada provedor com cada operadora iria fragmentar a Internet no mundo. As plataformas que não tivessem nítido interesse comercial no Brasil, poderiam não negociar com as operadoras daqui. Muitos sites seriam inacessíveis aos usuários brasileiros. Os prejuízos para a população seriam imensos. Os princípios básicos da Internet cairiam por terra no mundo todo.

Por fim, as big techs afirmam que, sem elas, a Internet seria muito menos interessante. De fato, sem YouTube, redes sociais, Google, Twitter, Netflix, Amazon e outras gigantes, possivelmente os bilhões de pequenos clientes que as big teles têm mundo afora, seriam drasticamente reduzidos. É verdade que as grandes plataformas ganham muito. Mas, se têm que pagar mais a alguém, não seria para as operadoras de telefonia. Que tal recolher mais impostos?

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