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RIQUEZA QUE SÓ A INTERNET PODE CRIAR

A gente fala muito do que não entende e dá valor a coisas sobre as quais não sabemos nada. Há décadas uma bandeira de combustíveis divulgava enigmática vantagem perante os clientes: “-só a nossa gasolina tem ICA.” Então tá, o que é ICA? Uma sigla, em inglês, que quase a totalidade dos engenheiros do mundo não sabia ao que correspondia na prática. Muito menos o cidadão comum, que dava a preferência ao produto com a sigla.

Desde sempre isso acontece. Poemas eruditos, com palavras de uso raro, já faziam analfabetos se emocionarem. Compostos até da pasta de dente são desafios ao nosso vocabulário. Até que determinada situação nos obrigue a superar aquela ignorância em particular. Parece que já chegou a hora de você saber o que é bitcoin. “Ah, é uma moeda digital”, ou “virtual”, não diz quase nada sobre esse sonho de uma nova economia. Ou sobre um investimento que pode valorizar mais de 15% em dois dias.

A moeda é baseada em criptografia. Um bitcoin é o conjunto de uma chave pública e uma chave privada. Quem tem a chave privada é o dono daquele bitcoin (ou BTC, ou ainda XBT).

A ideia da tal moeda virtual surgiu com o lançamento anônimo do protocolo de uma rede P2P de código aberto. Cada computador que passa a ser integrado à rede pode gerar 50 bitcoinsdesde que, utilizando um determinado aplicativo, o usuário resolva desafios matemáticos de criptografia. Isso acontece, em média, a cada dez minutos.

As negociações em BTCs são checadas por nodos da rede, escolhidos aleatoriamente para cada caso. Assim a moeda não pode ser fraudada de qualquer forma.

Quem desenvolveu esse sistema lançou tudo pela Internet sob o pseudônimo de Satoshi Nakamoto. Possivelmente era um pequeno grupo de conhecedores das ciências da computação, até hoje não identificado. Acredita-se que seja mais ligado ao meio acadêmico do que ao mercado. Em 2010, quando foi lançada a moeda, a primeira compra exigiu a importância de 10.000bitcoins por uma pizza que custava US$ 25,00. Cada um desses 10.000 BTCs vale hoje mais de US$ 2.000 dólares.

Assim como as outras moedas ela tem oscilações na cotação de mercado. A estimativa é de que, em um ano, cada BTC esteja cotada, no mínimo, a US$ 3 mil. No entanto analistas acreditam que, nesse período, é realista estimar que a cotação da moeda esteja a US$ 10 mil. Interessante, né!?

DINHEIRO, UMA COISA SUJA

Toda moeda é uma representação de valor aceita num determinado grupo social. As moedas já foram lastreadas em ouro e em outros valores. Mas hoje são garantidas pelos governos nacionais que as emitem. Ao lançar o sistema bitcoin, o sonho de Satoshi Nakamoto, ou de quem quer que ele(s) seja(m), era criar uma moeda global, livre da interferência de qualquer governo e dos bancos, uma moeda totalmente decentralizada.

Muito bom porque barateia as transações, evita a interferência custosa dos bancos e agiliza negócios em qualquer parte do mundo. Muito perigoso também, porque facilita compra de drogas, de armas, financia pedofilia e outros crimes hediondos. No maior ciber ataque da história, há poucos semanas, os criminosos exigiram resgates em BTCs.

Essas características da moeda digital atraíram a atenção de comunidades hackers e de grupos que se identificam com ideais anarquistas e libertários. Eles contribuíram para a evolução da ferramenta open source. Num evento realizado em 2013 sobre a economia bitcoin estava Jacob Appelbaum, um “cypherpunk”, conhecido por muitos como o homem mais perigoso do ciber espaço. Nesse tipo de evento, no entanto, o risco é “ideológico” porque atrai pessoas não identificadas com o sistema político-econômico hegemônico.

Quanto ao risco de lavagem do dinheiro do crime ou do terror, as instituições de câmbio que trocam a moeda digital por moedas nacionais – como o Mt Gox, do Japão – sofrem fiscalização nas grandes transações. O próprio sistema bitcoin grava as transações de grandes valores o que torna difícil, para os criminosos, lavar grandes quantias.

É por isso que o status do BTC está crescendo na Economia Mundial. No Japão o BTC já é reconhecido como meio de pagamento, sites importantes, como o WordPress, já aceitam a moeda em seus negócios. Isso inspirou a criação de muitas outras moedas virtuais que já circulam pela Internet, expandindo essa ideia.

A “CONTRIBUIÇÃO” DO PARLAMENTO BRASILEIRO

Nesta quarta-feira vai acontecer a primeira reunião de uma Comissão Especial da Câmara dos Deputados que tem uma missão surpreendente, pra não dizer impossível. Pretende regulamentar as negociações com moedas virtuais no Brasil. O Deputado carioca Aureo Ribeiro, autor do Projeto de Lei, anuncia que “vamos trabalhar para proteger o consumidor brasileiro e criar uma legislação que possa ser referencia mundial”. Ele considera o fato de que “tanto o Banco Central como o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) e os órgãos do consumidor já tem competência para fiscalizar e regular moedas virtuais.”

Desde o surgimento do BTC a comunidade financeira internacional tenta colocar rédeas no movimento. Se fosse possível, já deveria ter acontecido. A proposta do Deputado parece vir na mesma maré dos bancos e operadoras de cartões de crédito. Tentará criar embaraços para quem compra e para quem vende em BTCs.

Fica difícil mensurar o quanto isso interessa ao Brasil. Somos uma nação que mais apanha do sistema financeiro do que leva vantagens ao lado dele. Talvez uma legislação que valorize os meios alternativos de pagamento poderia ajudar a sermos vistos com mais respeito pelos bancos.

Alguma eventual dificuldade que a nova lei represente pode ainda levar o consumidor a fazer compras fora do Brasil, principalmente pela facilidade dessas operações pela Internet, de onde as moedas virtuais são nativas.

O projeto de lei foi apresentado em 2015 mas a tramitação ficou suspensa por algum tempo. Com a criação da comissão especial, instalada na semana passada, espera-se dar um novo fôlego à ideia. O projeto inclui também negócios com o uso dos pontos gerados por milhagens oferecidas por companhias aéreas.

Nesses tempos de tanta exposição do nosso parlamento na mídia internacional, nos resta torcer para que o tal projeto traga alguma coisa de útil para a discussão dessa questão em nível mundial. Caso contrário nossa capacidade de escolha, como eleitores, tende a ficar mais comprometida diante da opinião pública planetária.

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