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ESTAMOS APENAS NO COMEÇO

Existem “concessões de fé” na nossa relação com a mídia. Por exemplo, quando num filme de ação, o herói da trama está invadindo sozinho um esconderijo dos bandidos. Ele chega por trás, de mansinho, e dá um golpe de karatê na nuca de um sentinela do mal. O personagem surpreendido cai desmaiado no chão, sem qualquer reação. E vai ficar por ali, nocauteado, o tempo necessário para a trama desenrolar. Ora, quem já viu uma luta de MMA sabe que, por mais contundente que seja o golpe, no máximo em 30 segundos o nocauteado acorda. Mas, se você quer assistir ao filme, deixe de chatice e esqueça o sentinela caído ali.

Numa situação intermediária, a publicidade também exige um pouco da sua fé. “O mais puro malte” está em todas as cervejas, de todas as marcas. Aquelas lojas de departamento bem populares anunciam descontos de até 70% – e repetem! – com o número destacado no vídeo. Mas ninguém espera encontrar isso na loja.

As marcas e o público já se acostumaram com esse pequeno limbo da realidade na relação: “-me engana que eu gosto” fica subentendido entre as partes. Até que…

O espaço virtual vai crescendo e as marcas vão plantando ali seus avatares, os sites. Um canal de comunicação a mais, uma vitrine – e agora também um balcão – nos domínios binários da Internet. Tudo muito bonito na home porém, lá pelos cafundós do “fale conosco” o clima da conversa esquenta. Tudo bem, entre quatro paredes, ou inbox para o administrador do site, não dá nada.

Daí vêm as redes sociais e as marcas resolvem que vão ser seu melhor amigo! “-Vem cá, vamos bater papo, quero saber de você.” É quando o tal do consumidor, que é também contribuinte, condômino, correntista, mutuário, cotista e outros tipos de devedor, não consegue se encaixar no escrete. Ele fica bravo, avacalha os slogans exagerados, cobra as promessas e, o pior de tudo, fica esperando resposta. Não é “amiguinho” agora? Então responde, explica, resolve.

A saída de empresas das redes sociais começa a mostrar o limite da distância que precisa existir entre o público e determinados tipos de negócio. E tem outras lições sobre a presença de empresas nas redes sociais.

TEM QUE VALER A PENA

A BBC News divulgou cases de empresas egressas de redes sociais. Uma delas tem razões objetivas para sair do Facebook. A editora da revista masculina Playboy, com 25 milhões de seguidores na rede social, reclamou do puritanismo dos gestores. Para quem vive de publicações de ensaios fotográficos eróticos, faz sentido sair do Facebook.

Nos outros casos não houve justificativas claras para deixar redes sociais. Usaram frases feitas contra redes sociais como “não à busca desesperada por likes”, “mais convivência pessoal”(??), lero lero. Ficou a impressão de que o problema é custo.

Não que as páginas empresariais nas redes sociais sejam absurdamente caras. Mas o atendimento remoto. Um atendente de rede social não pode ser o mesmo dos SACs. Esses últimos são treinados com meia dúzia de frases padrão e procedimentos para encaminhamentos. No outro caso, conversar com alguém por uma rede social, exige mais habilidades de comunicação. Quem sabe as futuras gerações de bots, quando estiverem mais acessíveis, possam fazer esse papel. Por enquanto, o custo e treinamento de interlocutor deve ser muito alto.

Lá pelas entrelinhas, e pela experiência que praticamente todos temos com redes sociais, fica a impressão de que um certo “excesso de comunicação” está começando a demonstrar sinais de fadiga. Principalmente depois do boom do WhatsApp e outros aplicativos OTT para celular. Não escolhem hora, nem lugar, para avisar que uma nova mensagem chegou. Aquelas coisas que a gente logo abre e tem a sensação de que perdeu tempo. A enxurrada de bom dia, mensagens de motivação, de exaltação moral, ou aquelas correntes do tipo “repasse ao maior número de pessoas”. Isso sem falar nas fake news, na apologia mentirosa a políticos, “gemidão”, piadas sem graça. Ou ainda, aquela pornografia bem baixaria que você abre no metrô, ao lado de algumas senhoras.

Como é provável que alguma coisa útil apareça por ali, convém consultar. Ou vai ouvir pessoas perguntando por que você não foi à festa surpresa de aniversário de um amigo, que foi organizada pelo Facebook ou outra rede social.

Estudos recentes começam a apresentar sinais consistentes do custo que essa grande implosão nos impõe, ao absorver nossas vidas para dentro das redes sociais. Algo que compromete planos profissionais, de desenvolvimento pessoal e até afetivos. É só mais um sinal sério de que a Internet ainda está só começando. E de que as chances de escapar dela são muito remotas.

COM A CALÇA RASGADA

Ruim com ela, pior… com apenas uma parte dela. Essa é uma outra dimensão do desafio Internet, que aflige particularmente o Brasil. Já não bastasse ouvir que somos trabalhadores de baixa produtividade, que valemos frações de um operário sul-coreano, agora precisa ouvir também que somos internautas com freio de mão puxado.

O Brasil está seguramente entre as três maiores populações de internautas no mundo. Mas a velocidade de navegação é humilhante! Mais uma vez, fração do que se navega em outros ares. Um problema muito sério, que pode custar o seu emprego. É o que consta do 1o. Brazil Digital Report, apresentado nesta semana pela McKinsey & Company, destacada consultoria de estratégia de negócio, sediada nos Estados Unidos.

Segundo o relatório, que precisou passar por várias mazelas brasileiras, “a logística de entrega e a baixa velocidade de transmissão de dados via internet são dois dos desafios estruturais que o país precisa vencer para atrair investidores.” Em outro ponto, a carência educacional é citada como consequência de uma administração preocupada em “construir escolas”, sem se importar com a qualidade do ensino. Ao final o relatório conclui que “o brasileiro está preparado para a revolução digital, mas faltam leis que funcionem, ambiente político que dê segurança ao investidor e logística”.

Num evento, divulgado pelo portal UOL, o relatório de 191 páginas foi apresentado para explicar por que o Brasil não é um bom lugar para investir em determinados negócios. Tá vendo o seu emprego aí!?

O problema tem vários nomes. Mas um deles é o setor de telecomunicações. O Brasil tem as tarifas mais altas do mundo nesse segmento, e agora surge mais um relatório internacional atestando a precariedade dos serviços no país.

Aos 100 dias de uma nova gestão no Governo Federal, convém destacar a urgência em se equacionar problemas desse tipo. A parte mais difícil, que é a multidão conectada, já temos. O que falta são soluções de infraestrutura, para que o potencial do país se revele aos investidores. Não apenas nos negócios via Internet, mas em muitos outros setores, além de botecos e farmácias.

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