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O EDITAL QUE PODE IMPEDIR O LEILÃO DO 5G

Não ficou pedra sobre pedra. O relatório da área técnica do TCU – Tribunal de Contas da União simplesmente desconstruiu o edital do leilão de frequências para o 5G. Não é esse relatório da área técnica que define a aprovação ou não do edital. Porém, a série de inconsistências apontadas, chega a desmoralizar o Ministério das Comunicações e a Anatel. Isso torna tudo muito complicado. Mesmo que o ministro-relator Raimundo Carreiro (TCU), desconsidere o relatório e apresente um parecer favorável, o plenário da corte terá que aprovar. Sem contar que as possibilidades de retaliação do Congresso ou mesmo de judicialização seriam grandes.

O relatório da área técnica veio a público na segunda-feira. Na quarta-feira, em nota oficial, a Anatel deixou claro que a aposta do governo é no voto político dos ministros do TCU. A nota não cita o relatório, trata apenas de forma genérica as “… diferentes perspectivas técnicas entre os órgãos…” e exalta a importância do diálogo, pois “… contribui significativamente para a solidez do instrumento editalício a ser publicado.”

O relatório, porém, propõe o diálogo em outras bases. Ele não trata de “diferentes perspectivas … entre os órgãos”, mas questiona “ilegalidades”, “irregularidades”, “violação”, “prejuízos ao erário”, dentre outros itens que desabonam o edital. Nas 270 páginas do relatório a quantidade apontada de irregularidades primárias impressiona. Antes de citar algumas delas é importante destacar que a ideia central que norteou o edital estaria equivocada, segundo os técnicos do TCU. Tentaram usar um modelo que não se encaixa no caso do leilão 5G. O valor das frequências a serem leiloadas estaria em torno de R$ 45 bilhões. Mas a maior parte desse valor seria destinada como “obrigação para compromissos de investimento”. Isso significa que as próprias empresas vencedoras utilizariam esse montante para obras do 5G nas áreas de “baixa atratividade econômica” e outras de interesse do governo.

Os dois principais “compromissos de investimentos” seriam a construção de uma rede privativa do Governo Federal – para garantir maior segurança da rede. E o outro seria a implantação de cabos subfluviais de fibras ópticas para conectar a Amazônia. De pronto o relatório do TCU apontou essas propostas como ilegais. Seria um meio de construir sem concorrência pública, por preços que as próprias operadoras, concorrentes no leilão, vão determinar. Os critérios de precificação? Você pode tirar suas próprias conclusões. Para a faixa de frequência de 3,5 GHz o modelo da Anatel indica apenas 60 municípios “economicamente atrativos” em todo o Brasil. Entre os “não atrativos” o modelo da Anatel inclui Brasília, Salvador, Porto Alegre, Niterói, Guarulhos, Campinas, São José dos Campos e outros de elevado PIB. Nessas cidades, as operadoras não precisariam investir o próprio dinheiro. Contariam com dinheiro público (dos lances do leilão), sob o argumento de que a operação não trará retorno econômico suficiente. Mesmo no caso das duas grandes obras, o relatório conclui que elas seriam construídas “… sem um contrato firmado com a Administração Pública, sem garantias de execução e sem sanções previstas em caso de descumprimento de etapas da construção, de especificações ou do cronograma.”

Nessas previsões de investimentos os erros vão bem além. Em determinadas cidades a quantidade de ERBs – Estações Rádio Base chega a ser 8 vezes maior do que o necessário. O cálculo da depreciação de torres metálicas e fibras ópticas considera apenas metade do tempo que efetivamente duram. A “limpeza de faixa” com migração da TVRO – antena parabólica para televisores em áreas remotas – o preço dos kits foi calculado com base em uma média do que é cobrado no varejo. Sem considerar que serão necessários milhões de kits, comprados em grandes lotes, com previsível redução dos valores por escala.

O relatório do TCU cita casos em que os preços de faixas de frequência estão superestimados. Por outro lado, um artigo do edital “permite a outorga, sem licitação ou chamamento público, de lotes que não receberem ofertas de preço durante o leilão de 5G.” Se o alto preço dificultar o arremate no leilão, o lote pode sair de graça. O TCU quer a exclusão desse artigo. São 270 páginas de questionamentos, o que dá uma ideia de quanto vai longe a lista de problemas no edital. O Ministro Fábio Faria diz que qualquer alteração no edital atrasaria o leilão em 8 meses. Para ele, o TCU sabe que “… a cada mês que a gente não tem leilão do 5G a gente deixa de ganhar R$ 2,8 bilhões.”

Ontem, surpreendentemente, a aparente unidade do governo em relação ao edital começou a mudar. Convidado para uma reunião da Comissão de Educação da Câmara, o Ministro Paulo Guedes, da Economia, disse que não participou de nenhuma reunião sobre o leilão do 5G. E lamentou que o edital não contemple o 5G nas escolas. “-É parte dessa nossa falta de entendimento”. Ainda nessa quinta-feira, durante o Fórum Proteste 5G, outro posicionamento público foi na contramão da visão do Ministro Fábio Faria. O presidente do sindicato nacional das grandes operadoras (Conexis), Marcos Ferrari, disse que “Se for necessário discutir mais o edital para que ele esteja completo, melhor.” Ele deixou claro que as teles concordam com um adiamento do leilão. Esse eventual adiamento, contudo, comprometeria o uso da obra no calendário eleitoral, e isso parece ser inaceitável para o Ministro das Comunicações.

(com informações dos sites Teletime e Convergência Digital.)

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