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“REVENDO OS MEUS GUARDADOS…” UM VERSO DO PASSADO

Quem tem uma conta de e-mail ativa há mais de 10 anos, pode procurar: vai encontrar lá e-mails com mensagens marcantes, ou fotos maravilhosas, possivelmente com fundo musical. Pelo menos uma vai estar lá. Prá que!? Possivelmente porque as pessoas acreditam que um dia aquilo vai ter alguma utilidade. Aprendemos isso quando as mães guardam saquinhos plásticos, algumas garrafas de vidro, papel de presente, embalagens de padaria para doces e outras inutilidades domésticas. Ficam ocupando espaço – físico – juntam poeira até que num daqueles dias de faxina geral, vão para o lixo. E o pior, na maioria das vezes, nem são levados para reciclagem.

E o seu celular, já travou? O WhatsApp ocupa mais algumas dezenas de megabytes diariamente na memória. Enquanto dá pra abrir os vídeos e fotos, alguma coisa compensa. Depois que trava, tem que ir lá na pasta de arquivos pra apagar tudo. Tudo!? Não, essa aqui é muito engraçada, essa outra eu vou replicar no segundo turno do campeonato, essa é muito linda… O Facebook, prevendo esse transtorno de comportamento, disponibiliza espaço – digital – à vontade, pra entulhar inutilidades que nunca mais vamos acessar. Porém, dormiremos com a sensação de que aquilo está guardado. Enquanto lembrarmos.

O mundo cibernético é irônico. Ele satisfaz nossos desejos tão completamente, que nos deparamos com um dilema de infância: e se eu conseguisse tudo que eu quero?

CUIDADO COM O QUE VOCÊ QUER

Foi uma areia desse tipo que o Snapchat jogou na maionese onde muitos viajam. Uma história que só poderia acontecer neste Terceiro Milênio. A começar pelo fato de que o fundador da “Não Rede Social” nasceu no ano 2000, quando se encerrava o milênio anterior. Em 2011, o impúbere já tinha seu aplicativo acumulando usuários pelo mundo, num ritmo que permitiu somar mais de 700 milhões de internautas até a última contagem, fechada há algumas semanas. Dentre eles, Hillary Clinton e Bernie Sanders, pré candidatos à disputa pela presidência dos Estados Unidos.

Não se sabe exatamente por que o garotinho Evan Spiegel, criador do Snapchat, não quis que nada ficasse armazenado na memória do sistema. Seria o custo para manter um gigantesco bancos de dados? O mais provável é que ele temia a perseguição dos adultos. O aplicativo se multiplicou inicialmente com a distribuição de imagens pornográficas entre adolescentes de escolas americanas. Como qualquer postagem dura no máximo 24 horas, ou duas exibições, depois disso, tá limpo.

Outra característica estratégica é que os grupos se formam com usuários denominados por um apelido seguido do número do telefone. Quem não souber seu apelido, não tem como se aproximar de você. Assim o grupo fica muito mais fechado, o que leva seu criador a insistir que não se trata de uma rede social. Um conjunto de gangues, talvez. Só entra quem tiver proximidade pessoal com alguém, a ponto de merecer a revelação do apelido. O que você postar vai ser, necessariamente, acessível a todos daquele grupo. Nem mais, nem menos.

DEIXA O TEMPO PASSAR

A verdade é que o poder cibernético de multiplicação da experiência mostrou que a gente é mais assim mesmo. As coisas passam com o tempo, insistir em mante-las pode trazer problemas, no mínimo é um saco. Essa é uma grande parte do sucesso do Snapchat. Imagine se todo visitante super legal que chegasse à sua casa ganhasse um quarto permanente por ali. Ou, mais concretamente falando, quando armazenamos excessivamente o prazer de comer os brigadeiros e beijinhos tão especiais daquela festa. Mais sensato é aceitar a natureza efêmera das coisas, porque só assim estaremos disponíveis para sermos surpreendidos por algo melhor.

É essa simplicidade que está se mostrando tão atraente para o público, principalmente jovens. Os dados mais recentes dão conta de que, entre os 100 milhões de usuários americanos do Snapchat, 86% tem menos de 35 anos. Se as gerações mais antigas tanto se preocupam com o descarte ecológico, o ecológico está passando a ser o descarte nas novas gerações. Pelo menos no espaço digital. Para todos, jovens e velhos, fica a indicação de que precisaremos, cada vez mais, de critérios para guardar e como guardar o que realmente tem algum valor. O conhecimento que geramos, a cultura, as experiências de vida, merecem uma relativa infinitude, uma indexação precisa, para mostrarem utilidade em algum tempo. O resto, é só resto. Se, há tanto tempo, já não temos mais paciência de assistir a vídeos de casamentos, nem de ver álbuns de família, não vai ser nos arquivos do Facebook que vamos encontrar algo que passou e ainda se mantém muito interessante. Vamos nos permitir mais surpresas.

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