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PENSAR PARA QUÊ? É SÓ ANDAR NA MODA

 

Daqueles vídeos de WhatsApp, Youtube, … Um professor doutor se apresenta. Ele é titular de uma universidade pública de muito prestígio. O assunto é comportamento político, polarização, democracia. Em determinado momento começa a falar sobre algo que tem acontecido muito de alguns anos para cá. Essa coisa de ignorar o outro só porque ele pensa diferente. Explica o professor – com as palavras certas e precisão teórica – que a discordância é uma das bases da democracia, não a concordância.

Quando duas partes concordam chega-se ao “ponto pacífico”. O que já era vai continuar sendo. O novo só poderá surgir da discordância, isto é, se o diálogo acontecer. O problema é que a moda agora é cancelar: “- Ihh, esse cara é da outra turma, do outro lado, do outro mundo.” Cada vez mais polarizado, mais binário, os meus pra cá, o resto pra lá.

Essa negação da inteligência, da capacidade de pesquisar, de compreender, de formar uma opinião e revisa-la a cada novo fato relacionado, vai se estendendo para além das preferências partidárias ou por pessoas. Está cristalizando algumas teses como verdades intocáveis, indiscutíveis para qualquer situação. Como se, colocar a inteligência para operar sobre a realidade, levasse a cometer uma besteira. O que basta é ler o enunciado da regra e cumpri-lo. Por exemplo, privatizar: “- É tudo de bom e você desfila modernidade no main stream.” Ou então, ouvindo o outro lado, “é a pior coisa que se pode fazer”.

A resposta é outra vinda de um país europeu capitalista, que vive sob um governo de direita. Sobre a venda da operadora italiana Tim o Ministro da Indústria local, Giancarlo Giorgetti, respondeu assim: “Respeitamos o mercado, mas qualquer oferta pública de aquisição precisa levar em conta uma estrutura dentro da qual o Estado não pode abrir mão do controle”. Acionista da Tim, o governo italiano reagiu contra a articulação do grupo americano KKR, que busca investidores para adquirir a tele por 10,8 bilhões de euros.

No Brasil, em alguns estratos sociais, está convencionado que privatizar é o caminho da salvação. Os políticos que professam esse dogma dizem que a culpa é dos políticos. Quer dizer, dos outros políticos. “Eles”, ou seja, aqueles que não são “nós”, querem altos cargos para seus protegidos, querem fraudar os sistemas de compras dessas empresas, desviam verbas. Os funcionários também, segundo os privatistas, formam corporações poderosas que conseguem grandes benesses, além dos salários altos. A pergunta é se não existem leis e demais instrumentos legais para coibir esses ataques ao interesse público. Existem remédios legais, mas são muito “impopulares”. Significa que, se um mandatário pensar em agir de acordo com a lei, terá muitas dificuldades para conseguir votos na eleição seguinte. Por isso tudo, privatizar passa a ser o caminho.

Difícil aceitar argumentos desse nível quando se deseja em um país próspero. Afinal aceitar, o cenário do que seria um desgoverno, como regra para decisões tão importantes, em última instância significa estar de acordo com tudo isso. Significa agir para que tudo continue como está. Parece que a questão de privatizar ou não deve se enquadrar no critério cabível para tudo dentro do poder público: a justiça. Em vários casos é justo que se privatize determinados empreendimentos públicos. Um caso clássico no Brasil são as telecomunicações. Por mais que se critique como foi planejado, depois de executado o modelo parece ter se confirmado como sendo correto. Nos idos de 1960 como poderia ter expandido as telecomunicações num país continental e pobre? Vencida a proeza, chegou a hora de privatizar. Não seria justo manter um setor tão dinâmico para ser dirigido no ritmo estatal. Poderia reservar uma Golden Share nas mãos do governo. Houve muitas outras falhas na privatização, mas fica difícil dizer que a empresa deveria continuar estatizada.

Por outro lado, ao passar para os “competentes e honestos” gestores privados, não se viu nada do prometido. A qualidade dos serviços caiu bruscamente e as tarifas tiveram aumento real de 5 vezes. Mais uma vez a lei ficou esquecida. Ninguém pode agir em nome do interesse público? Eis a resposta para aqueles que pensam na privatização como forma de disciplinar o estado. Se não há capacidade do gestor público para moralizar empresas públicas, tampouco haverá para disciplinar serviços públicos concedidos ou autorizados. Pelos dois caminhos a população continuará sendo mal atendida e onerada.

Isso tudo dá oportunidade para o lado anti-privatista agir, fortalecendo outro discurso falacioso, de que nunca é bom privatizar. Uma das comissões permanentes da Câmara dos Deputados já aprovou projeto de Lei do deputado André Figueiredo (PDT-CE) que torna exclusivo da União a prestação de serviços públicos estratégicos de tecnologia da informação. Falta a discussão nas outras comissões. O projeto também impede a privatização do Serpro e da Dataprev. Não precisaria que uma lei fosse criada para impedir tamanha insensatez.

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