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MUITO PRÁ LÁ OU PRA CÁ DA EDUCAÇÃO

Uma frase comum de se ouvir em palanques de campanha política. Uma frase comum de se ouvir em tribunas de plenários. Uma frase comum de se ouvir também depois de tragédias: “-O importante não é punir, é educar.” Dependendo da narrativa, até se encaixa. Não é sempre o caso. Numa questão de trânsito, quando se trata de falha do motorista, hoje categorizado como condutor. A falha é uma questão de educação? Para uma pessoa ser considerada condutora ela tem que ser alfabetizada, comprovar condições de saúde necessárias – inclusive psicológica – tem que estudar todos os sinais de trânsito, as leis específicas e comprovar, por testes presenciais, que aprendeu tudo. E, finalmente, tem que demonstrar habilidade para conduzir um veículo com segurança. Depois essa pessoa estaciona em local proibido, toma uma multa e reclama com o jargão “punir não, educar sim.”

Se você não concorda é exatamente isso que aqui está sendo abordado: a importância de se ter uma visão mais crítica em relação a tudo que chega pela mídia, caso deste artigo, por exemplo. Para tanto, o governo quer levar “educação midiática” para os bancos escolares do ensino básico. Em princípio, a iniciativa parece mais uma resposta para quem reclama por não punir, mas educar. Serviria como prova de que ninguém queimou etapa, olha aí no planejamento curricular da escola. O objetivo evidente mesmo é a “licença” para punir.

O nome escolhido foi muito feliz – Educação Midiática – e não se quer aqui desconsiderar as muitas boas intenções que certamente envolvem a iniciativa. Também não se pode falar que a nova disciplina escolar não vai alcançar os objetivos a que se propõe. Apenas considera-se que interesses políticos estão muito relacionados com esse tema, que já está em consulta pública. A proposta é até mais abrangente, envolve toda uma política de educação midiática.

Ter uma disciplina escolar sobre determinada causa tem sido uma fórmula recorrente para demonstrar uma preocupação concreta a respeito de algo. Um ardil deplorável, quando acontece por iniciativa de políticos. “Passar uma lei” criando uma disciplina obrigatória na escola é sofismático. Temas importantes como educação sexual ou educação religiosa até hoje não conseguiram um padrão eficiente de abordagem. Até porque educação escolar e educação familiar ainda não foram tratadas com a devida profundidade. Criar uma disciplina escolar é um processo complexo, cuja última providência seria a aprovação da respectiva lei. Começar da maneira inversa corresponde a criar um problema.

Mais uma vez, a crítica ainda não cabe para essa tentativa de educação midiática. Afinal o governo começou por mobilizar ministérios e colocou em discussão um documento sobre uma política para o tema, que deve envolver também uma disciplina escolar. Talvez esse movimento seja suficiente para não “queimar a etapa”. Afinal, oficialmente já existe uma ação concreta no sentido de educar para a mídia. A dúvida é se, além de liberar a etapa de punições, esse esforço vai alcançar seu objetivo anunciado, que define “a educação midiática é o conjunto de habilidades para Acessar, Analisar, Criar e Participar de maneira crítica do ambiente informacional e midiático em todos os seus formatos, dos impressos aos digitais, como requisito fundamental para a formação do cidadão e para o fortalecimento da democracia.”

Para além dos benefícios que essa política pode ou não trazer, é curioso observar em qual calo se pisa, para que todos ouçam o grito. A chamada “lei das fake News” não é um recurso para um cidadão qualquer recorrer. É uma lei que autoriza ações sumárias contra mentiras com grande potencial de repercussão. Não será a honra da dona Maria que essa lei vai socorrer. Mas daqueles que têm grande potencial de repercussão a partir da própria imagem.

Aqui para a turma do andar de baixo, do ponto de ônibus e da fila do banco, a educação midiática é um passivo muito antigo. Quanto se reclamou nas reuniões familiares, nas escolas e até nas delegacias de polícia, do monte de cenas e mensagens impróprias nos canais de TV, nas capas de revistas, nos cartazes do cinema. Hoje existe a Internet, mas a sociedade já convive com muita mídia há décadas. Parece que, concretamente, a política nunca se preocupou com isso. Não buscou qualquer resposta para tanta reclamação. Agora, as gerações que essa mídia ancestral influenciou, viu na Internet a oportunidade de pôr pra fora tudo que engoliu de qualquer jeito ao longo do tempo. Que educação pode ser dada agora contra esse mal?

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