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A CIÊNCIA HUMANA E A TV

“-Amor, você acha que esses brincos combinam com o meu corte de cabelo?” Ela fala na maior felicidade. Para as mulheres em geral, se enfeitar para aparecer em público é algo excitante. O “Amor” pode estar irritado. Não só porque não entende o que brincos tem a ver com corte de cabelo, mas pelo atraso que aquela decisão vai causar ao compromisso. “Coisas de mulher”, diriam os machistas.

Pois esses ogros deveriam ouvir o que Barack Obama confessou a respeito da tarefa de se vestir: “-Vocês devem ter percebido que só uso ternos cinzas ou azuis. Não quero decidir sobre comida ou roupas, porque tenho tantas outras decisões a tomar.” Veja só, macho que enfrenta terroristas, confessando que escolher roupas, cansa. Não é só ele. Mark Zuckerberg, o bilionário do Facebook, que usa camiseta cinza idêntica todos os dias, explicou que quer liberar a vida dessas questões, “para que eu precise tomar o mínimo possível de decisões sobre qualquer coisa que não seja a melhor maneira de servir a esta comunidade.” Como superstição é coisa de brasileiro e um diagnóstico de Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC) não cai bem para celebridades, resolveram investigar melhor esses argumentos. E não é que são consistentes!? Para a Psicologia, trata-se de “fadiga decisória”, um fenômeno que tem a ver com uma parte do cérebro encarregada do “controle executivo”.

A HIPNOSE, DO DIVÃ AO SOFÁ

O controle executivo ficou mais popular quando foi substituído pelo controle remoto. Ou não exatamente substituído, mas colocado no modo “stand by”. Hoje existem bases científicas para afirmar que a decisão de trocar de canal cansa. O controle remoto permitiu zapear rapidamente, pra um lado e pro outro, sem que o cérebro precisasse decidir. De repente aparece alguma coisa na tela que arrebata a atenção do detentor do controle do ambiente, garantindo o conforto típico do sedentarismo televisivo.

Esse é apenas um dos detalhes ocultos no complexo fenômeno chamado TV aberta. Hoje, convertida numa “internet” com fluxo unidirecional gigantesco de dados, a TV digital. Com certeza, se ainda não tivessem inventado a TV aberta ela viria como um aprimoramento da Internet. Por que ter uma estrutura de comunicação tão gigantesca sem contar com a capacidade de falar a todos de uma vez? Ela já antecipou uma tendência presente em todos os grandes “cases” da Rede, que é a gratuidade. Ou alguém tem boleto de mensalidade do Youtube, do Facebook ou WhatsApp?

A TV aberta antecipou as tendências que a Internet veio pra consolidar como a universalidade, a gratuidade, a massificação. E agora terá também a interatividade. Tanto que, o lado mais capitalizado da tecnologia está preocupado, não para de arrumar apelidos desabonadores para a tela mais popular do mundo. Foi o que se viu durante a última edição da IBC, na semana passada, em Amsterdã. O maior evento da engenharia de televisão da Europa teve rodas e rodas de especialistas apostando no fim da TV aberta.

PRA QUEM GOSTA DE PROFECIAS

No hot site do evento era difícil saber o significado da sigla IBC – International Broadcasting Convention. A origem “broadcast” hoje é um peso para a maioria dos expositores, ligados à área de TI. Eles não querem aceitar que a TV aberta é a solução que a Internet precisaria algum dia. Neste ano, apenas um contrato da NFL, a liga de futebol americano, chegou a R$ 1 bilhão, para dar visibilidade ao tablet da Microsoft, exatamente na televisão. Todos os times receberam o produto para que os técnicos das equipes aparecessem usando o gadget… na televisão!

Vai demorar para inventar uma maneira mais interessante de não fazer nada. Não é comum, numa tarde de outono, alguém dizer que não vê a hora de chegar em casa, relaxar e consultar o line up dos canais, ou o menu do Netflix, pra escolher o que quer ver. O povo quer apertar apenas um botão pra chegar do outro lado da vida, que é o lado relax. É esse comportamento passivo da massa que vende. É a massa que faz das Casas Bahia a mais poderosa rede de varejo de aparelhos domésticos, sem se incomodar nem um pouco por ser uma referência brega. Não por acaso, a maior anunciante da TV brasileira. Nos Estados Unidos também é a popular rede Walmart que figura entre os blue chips da Bolsa de Nova York e não a maior rede de joalherias do país.

O ineditismo, diante de uma tecnologia que ainda está sendo descoberta, faz uma adolescente boca suja virar uma celebridade instantânea do Youtube, confirmando a profecia hippie de Andy Warhol: “algum dia todos vão ter direito a 15 minutos de fama”. Com certeza a mocinha sonha em se cacifar, nesses “15 minutos”, para chegar à TV aberta, verdadeiro palco da notoriedade.

Se parece irônico que uma tecnologia do século passado se confirme como uma premonição dos hábitos de comunicação, o mais inacreditável ainda pode estar por vir. A experiência de interatividade na TV pela TV, que o Ginga e o “Brasil 4D” estão viabilizando, pode se tornar o novo paradigma de uso da televisão no mundo todo. Com a integração com a Internet, a TV aberta digital passará a ter um fluxo bidirecional, que abrirá um leque maior de conteúdos para serem acessados pelo tradicional controle remoto. Mas será o suficiente para o telespectador descobrir a plataforma ideal de entretenimento? O futuro dirá.

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