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REGRAS QUE DESORGANIZAM OS SERVIÇOS PÚBLICOS

Burocracia é uma prática que tem história. Aliás, o que seria da própria história se não fosse a burocracia? Ela surgiu para organizar e essa é a parte boa. No entanto, você organiza suas gavetas do seu jeito, só você entende. E para organizar uma comunidade qualquer, alguém tem que decidir um único jeito para que seja feito. Por isso a burocracia foi ficando cada vez mais hierarquizada, rigorosa, de cima para baixo. Assim surgiu o lado ruim dessa tentativa de fazer as coisas funcionarem em conjunto. Boa ou ruim, ainda é muito difícil quando se pensa em mexer na burocracia.

Não é só no Brasil que burocracia é um palavrão. Quando escolheram esse nome para os sistemas rígidos de organização, foi para avacalhar. Já faz quase 300 anos. Talvez a ideia original de burocracia seja algo tão bom que faça muita gente tentar usá-la para resolver qualquer coisa. Daí o remédio passa da dose e vira veneno.

Quando se trata de algo muito poderoso, como um sistema de comunicação de massas, é regra sobre regra que jogam em cima da coisa. Como se isso fosse capaz de amansar a fera. É o caso das concessões de emissoras de rádio e de televisão. Wilson Wellisch, Secretário de Comunicação Social Eletrônica do Ministério das Comunicações, esteve na SET Sudeste, em Belo Horizonte, no início deste mês. Ele disse que quer continuar com o trabalho de simplificação dos processos de concessão e regulamentação de emissoras. Conceder um serviço público tão importante para um particular é uma grande responsabilidade. Mas, pelo que se comenta no setor, as regras vão bem além.

Por enquanto, o que o secretário promete é reduzir o prazo para transferências de outorgas, simplificar as regras para o licenciamento de estações de radiodifusão, estruturar o compartilhamento de estações, retomar a multiprogramação e fazer adaptações à nova Lei de Licitações. Essas mudanças, divulgadas pelo site TelaViva, têm maior ou menor importância para casos específicos de emissoras. O detalhamento delas pode ser muito complicado até porque são regras apontadas como vícios burocráticos. Porém, em alguns casos, já se sabe que há antecedentes. A multiprogramação, por exemplo, foi adotada na Europa quando implantaram a TV Digital.

É uma possibilidade técnica porque o novo sistema otimizou muito o uso do espectro. Assim, nos mesmos 6 MHz de banda que eram usados para cada emissora analógica é possível trafegar pelo menos 4 canais digitais diferentes. É o que se vê em algumas emissoras educativas no Brasil. Na banda da TV Cultura de São Paulo também trafega o Canal Univesp – a Universidade Virtual do Estado – e um outro canal educativo. Os dois canais secundários têm espaço específico para uma programação própria, que não preenchem completamente a grade de cada um deles. Então eles reapresentam boa parte da programação da TV Cultura. Para emissoras comerciais isso tem outro efeito. Se, por exemplo, uma grande rede nacional quiser a multiprogramação ela terá que multiplicar seu esforço de produção. E um canal tende a concorrer com o outro, pelo menos na ótica do anunciante. Ele sabe que o público que estiver sintonizado num canal secundário – de esportes, por exemplo – não vai assistir ao anúncio dele veiculado no canal principal. Esses estão entre os possíveis motivos que tornaram a multiprogramação um grande problema na Europa. No Brasil a multiprogramação não foi autorizada para emissoras comerciais.

Por outro lado a burocracia do Ministério das Comunicações está sendo reivindicada para outro setor. É a TVRO – Television Receive-Only, cujo sinal chega direto pela antena parabólica. Essa prática é antiga pois os moradores de regiões mais distantes não tinham torres repetidoras de sinal por perto. A saída foi apontar uma parabólica para o satélite de retransmissão dos sinais de redes nacionais. O que era improviso se tornou uma prática muito comum. E hoje atende milhões de famílias pelo Brasil. Com a chegada do 5G foi preciso usar a banda C do satélite para o sinal do celular. E não havia nenhum cadastro, nenhuma organização oficial desse uso de frequência. Agora as parabólicas da TVRO são apontadas para o satélite da banda Ku. Mais moderno e eficiente ele ampliou muito as possibilidades de recepção portanto, precisa de uma regulamentação. A TVRO vai ser classificada como um serviço ancilar à radiodifusão, tipo um anexo, como são classificadas as torres repetidoras, que espalham o sinal das grandes redes.

A desburocratização dos serviços de radiodifusão de TV e rádio é algo que vai passar pelos interesses de muitos políticos. Possivelmente, parte da burocracia que persiste até hoje, atende interesses políticos. As soluções técnicas para a radiodifusão são muitas e continuam crescendo. Os cuidados necessários com a comunicação de massa também aumentam, por conta das transformações que chegam, inclusive com a internet. As regras que excedem esses propósitos constituem a burocracia indesejável que precisa ser removida.

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