Dessas coisas que a gente encontra com certa facilidade quando anda pelas ruas… No país todo tem mais de 8.800 hospitais, de todos os tamanhos. Concessionárias de veículos ficam na casa de 7.300 estabelecimentos. Hotéis, são 10.600. Pequenos provedores de internet, comercialmente conhecidos como ISP, mais de 10.000. Esse último dado surpreendeu você? Para muita gente ainda parece que provedores de internet são apenas as 3 grandes empresas de telefonia, mais algumas grandes operadoras de TV por assinatura.
Os pequenos provedores somados construíram a maior rede de fibra óptica do Brasil. Oferecem um serviço de qualidade superior e por isso conseguem muitas empresas como clientes, desde as pequenas até as grandes. Se todos os ISPs do Brasil formassem uma única empresa, seria a maior provedora de internet do país. A estratégia é certeira: melhor serviço e menor preço.
Falando assim parece fácil. Porém, se você investe mais na qualidade do serviço é difícil praticar um preço menor. Se você investe menos, como pode oferecer um serviço melhor? Talvez a resposta esteja nesse número surpreendente de pequenos concorrentes. Num mercado tão mal atendido pelas grandes operadoras – ostentam vários títulos de campeãs em reclamações nos Procons – talvez seja fácil fazer algo melhor, mesmo gastando pouco. Pelo menos até que surjam fatores que tragam mais dificuldades. Como a falta de capital de giro, por exemplo. Mauricélio Oliveira, presidente da Abrint, uma entidade que representa ISPs, diz que as linhas de financiamento acessíveis não atendem as necessidades do setor. Na semana passada, em evento promovido pela entidade em Fortaleza, ele pediu que o BNDES, a Finep e o Ministério das Comunicações deem atenção a esse problema.
Com um olhar diferente, há cerca de 3 meses o banco BTG Pactual publicou um estudo. Trouxe até um tom otimista. Não para os pequenos provedores, cuja condição financeira sequer foi abordada. O estudo indicava que estaria se aproximando o momento das grandes operadoras consolidarem o mercado, ou seja, comprarem provedores de médio porte. Esses, por sua vez, estariam no meio da “cadeia alimentar”, comprando vários pequenos provedores, já há algum tempo. As planilhas do estudo descrevem com muita simplicidade a situação desse mercado de ativos. De acordo com os dados, 97% dos “provedores regionais” – como são tratados os ISPs no estudo – têm até 10 mil conexões entre seus clientes. Apenas 23 provedores teriam mais de 100 mil conexões, e somente 13, com mais de 200 mil conexões. Lá em cima, só 3 ISPs têm mais de 1 milhão de conexões. São a Brisanet, a Alloha Fibra e a fusão Vero/Americanet. O quarto a compor o grupo, em breve, deve ser a Desktop. Entre as grandes operadoras, Claro e Vivo já teriam afirmado que estão “se colocando abertas às oportunidades”. O estudo, segundo informou o site Teletime, aponta também a voracidade que tem tomado esse setor a partir de 2018, muito por causa do interesse de fundos de investimentos. Em 2022, quando o mercado não estava tão favorável, foram 969 transações de aquisições e fusões entre pequenos provedores. Em 2021 tinham sido 1.082.
No evento da semana passada em Fortaleza, Oliveira explicou a situação dos ISPs que atualmente trabalham com até 5 mil clientes. Muitos deles, durante o boom verificado em função da pandemia em 2020, viram uma oportunidade para migrar as conexões via rádio para fibra óptica. Na época, o financiamento disponível era o crédito pessoal, a juros de mercado. No entanto, o pay back desses investimentos fica entre 3 e 4 anos. Segundo Oliveira, agora algumas empresas têm mais de um terço das receitas comprometidas com bancos. Como essas empresas estão bem equipadas, o que falta é dinheiro para o giro. Entre as menores, com 2 ou 3 mil clientes, há casos de entregarem a operação para ISPs um pouco maiores, apenas para se desfazerem das dívidas.
Ainda de acordo com o Teletime, Carlos Azen, do BNDES, reconheceu que as linhas de crédito subsidiadas, com verbas dos fundos das telecomunicações (Fust e Funttel), não estão chegando na ponta. Há vários relatos de empresários, donos de pequenos ISPs, que procuram o financiamento em bancos públicos, como a Caixa, e ouvem do gerente que essas linhas de crédito não existem. Nem o varejo dos bancos oficiais está informado a respeito. No entanto, de acordo com Mauricélio Oliveira, em outras instâncias dos bancos, às quais empresas maiores têm acesso, há interesse nesses contratos. Ele prevê para breve a entrada de um grande player no mercado, com base nessas linhas.
Quem, mesmo sem saber, está gostando dessa fragmentação do mercado, são os consumidores. Mas a consolidação prevista a partir do ano que vem traz a preocupação dessa concorrência refluir, o que implicaria num aumento de custos para os consumidores. Afinal, se as grandes operadoras quisessem trabalhar com mais qualidade e preços mais justos, não teriam surgido 10 mil pequenos concorrentes no mercado.